"Eu não recearia muito as más leis, se elas fossem aplicadas por bons juízes. Não há texto de lei que não deixe campo à interpretação.

A lei é morta. O magistrado vivo. É uma grande vantagem que ele tem sobre ela" - Anatole France

quinta-feira, 12 de março de 2015

Toffoli vai para 2ª Turma do Supremo, que julgará políticos da "lava jato"

DANÇA DAS CADEIRAS

Toffoli vai para 2ª Turma do Supremo, que julgará políticos da "lava jato"





O ministro Dias Toffoli, do Supremo Tribunal Federal, se transferiu da 1ª para a 2ª Turma da corte. A decisão foi tomada depois de três membros da 2ª Turma terem feito um apelo para que alguém do outro colegiado fosse completar a composição, que está desfalcada desde a aposentadoria do ministro Joaquim Barbosa, em agosto de 2014.
É na 2ª Turma que atua o ministro Teori Zavascki, relator dos inquéritos decorrentes da operação "lava jato" que serão julgados pelo Supremo — a parte dos réus com prerrogativa de foro por função, os parlamentares. Um dos problema encarados é que, como a turma está com quatro integrantes, há sempre o risco de empates nas discussões.
O primeiro a pedir a transferência de um colega foi o ministro Gilmar Mendes, que depois foi apoiado por Teori e pelo ministro Celso de Mello. Gilmar argumentou que, além de evitar empates, a transferência de um colega evitaria o constrangimento do ministro que vier a ocupar a vaga de Joaquim Barbosa, já que ele iria direto para a 2ª Turma julgar a "lava jato".
Inevitavelmente recairia sobre o novato a suspeita de que ele foi indicado pela Presidência da República — ou aprovado no Senado — para fazer algum tipo de favor. “A ideia de uma possível composição ad hoc (para um fim específico) não honra as tradições republicanas e não seria compatível com a elevação que esta corte tem no cenário da República”, salientou. O artigo 19 do Regimento Interno do STF prevê a possibilidade de um ministro pedir transferência de Turma, mediante requisição ao presidente.
Pela regra regimental do Supremo, os ministros mais antigos têm preferência na troca de turmas. O presidente da corte, ministro Ricardo Lewandowski, diante do pedido de Toffoli, consultou o ministro Marco Aurélio, vice-presidente da 2ª Turma e o único mais antigo que Toffoli ali, mas ele declinou da vaga. Há um arranjo informal entre ele e o ministro Celso, os dois mais antigos, de cada um ficar em um colegiado.
Se mudança for aceita, Toffoli julgará ações relativas à operação "lava jato"
Fellipe Sampaio /SCO/STF
Bom para todos
Nesta terça-feira (10/3), a sessão da 2ª Turma aconteceu com três ministros, uma vez que a ministra Cármen Lúcia não participou, por motivo justificado. De acordo com o ministro Gilmar Mendes, a falta de indicação do 11º integrante do Supremo pela presidente da República está afetando os julgamentos no Plenário, mas impactando particularmente a 2ª Turma, já que aumenta o risco de empates.

O decano do STF, ministro Celso de Mello, classificou a sugestão do ministro Gilmar Mendes de “extremamente oportuna”, tendo em vista o longo período já decorrido desde que se abriu a vaga com a aposentadoria do ministro Joaquim Barbosa. O ministro lamentou a omissão na indicação do 11º integrante pela Presidência da República e afirmou que a inércia governamental está interferindo nos julgamentos do STF.
“O ministro Gilmar Mendes destaca outros aspectos como o da possível intenção de se promover uma composição ad hoc da 2ª Turma, o que é realmente inaceitável, tendo em vista as tradições do Supremo Tribunal Federal, que não se deixa manipular por medidas provenientes de outros Poderes, especialmente quando está a apreciar causas de grande relevo, como estas que vão se originar dos procedimentos investigatórios agora instaurados por determinação do ministro Teori Zavascki”, afirmou o ministro Celso de Mello.
O relator dos inquéritos da operação "lava jato", ministro Teori Zavascki, que também preside a 2ª Turma, qualificou a iniciativa do ministro Gilmar Mendes como muito importante. Lembrou que deixará a presidência do colegiado em maio próximo e que haverá incidentes nos inquéritos apresentados pelas partes investigadas que serão resolvidos monocraticamente, mas são passíveis de recurso de agravo, a ser analisado pela turma.
Teori ainda destacou que a mudança nas composições será uma forma de retirar do procedimento de indicação do novo integrante do STF pela presidente da República e da submissão de seu nome ao Senado Federal um problema adicional. “Será um forma de descompressão desse problema”, afirmou.
Dança das cadeiras
A ida de ministros da 1ª para a 2ª Turma não é surpresa para ninguém no Supremo. Toda vez que abre uma vaga, alguém faz isso. Foi assim com Eros Grau, Cezar Peluso, Cármen Lúcia, Joaquim Barbosa e Ricardo Lewandowski e Ayres Britto.

O que todos alegam é que a 2ª Turma é mais eficiente que a 1ª, ou que os julgamentos são mais "harmônicos". O que ninguém diz oficialmente é que a maioria dos ministros não consegue se acostumar com as argumentações sarcásticas do ministro Marco Aurélio. O vice-decano, é conhecido por ironizar os argumentos dos quais discorda. E mesmo votando de improviso, como sempre faz. Em tom de brincadeira, os ministros dizem que quando Marco Aurélio elogia o voto de alguém, é porque vai discordar veementemente.
Outro dado interessante a transferência do ministro Toffoli para a 2ª Turma é que ele deixa de ser voto vencido para ser vencedor. Ele era o mais veemente crítico da ideia de se negar Habeas Corpus substitutivo de recurso ordinário, mas se conceder a ordem de ofício quando se verificar violação direta à liberdade do réu. 
A jurisprudência foi inaugurada por Marco Aurélio. Outro grande crítico da ideia é o ministro Gilmar Mendes, para quem há uma "moda" em se restringir o uso do HC.
*Texto atualizado às 22h do dia 10/3 para acréscimo de informações.

Revista Consultor Jurídico, 10 de março de 2015, 21h20

Afastar Súmula 691 para presos da "lava jato" ainda é desafio no STF

PRISÕES MANTIDAS

Afastar Súmula 691 para presos da "lava jato" ainda é desafio no STF




Advogados que atuam na operação “lava jato” ainda não conseguiram ter pedidos de Habeas Corpus apreciados pelo ministro Teori Zavascki, do Supremo Tribunal Federal. Confiantes em uma decisão proferida há um mês pela 2ª Turma, eles vêm tentando afastar a tese de que o STF não pode apreciar HCs quando pedidos de liminares só foram negados monocraticamente em outros tribunais, como determina a Súmula 691. Mas, nos últimos dias, o relator do caso já negou ao menos quatro tentativas com base na norma.
A corte costuma afastar a súmula quando vê flagrante ilegalidade, abuso de poder ou afronta a sua jurisprudência, por exemplo. No dia 10 de fevereiro, a 2ª Turma considerou irregular a prisão preventiva do ex-diretor da Petrobras Renato Duque, por ter sido fundamentada na presunção de que ele poderia fugir por manter valores ilegais no exterior.
Teori Zavascki só abriu exceção até agora para ex-diretor da Petrobras Renato Duque.
Defensores de réus da “lava jato” ainda aguardam que o acórdão seja publicado para estudar o critério utilizado por Teori e pelos demais colegas. Outros já tentaram estender a tese aos seus clientes, sem sucesso. No dia 4 de março, o ministro julgou inviável pedido apresentado pela defesa de Erton Medeiros Fonseca, presidente da Divisão de Engenharia Industrial da Galvão Engenharia.
O advogado José Luis de Oliveira Lima, que representa Fonseca, alegou que a prisão do cliente foi baseada em irregularidades atribuídas à empresa onde trabalha, “não sendo possível identificar quais fundamentos referem-se especificamente ao paciente”, entre outros argumentos. Zavascki, porém, avaliou que as razões apresentadas não permitiram ignorar a Súmula 691.
Linha semelhante de defesa também foi adotada pelos advogados Alberto Toron, que defende Ricardo Pessoa, presidente da UTC Engenharia; Marcelo Leal de Lima Oliveira, defensor de três executivos da OAS; e Antônio Cláudio Mariz de Oliveira, que atua em favor de Eduardo Hermelino Leite, vice-presidente da Camargo Corrêa. Todos tiveram os argumentos rejeitados por Teori no dia 27 de fevereiro.
Para Mariz de Oliveira, ainda é nebuloso o critério para aplicar a norma. “Essa súmula é muito ruim, entra num campo extremamente subjetivo, quase que arbitrário. Seria preciso ter critérios rígidos”, afirma o criminalista, que agora seguirá outra estratégia — como o cliente assinou “acordo de cooperação”, nas palavras dele, será preciso desistir de recursos.
Hierarquia peculiar
A aplicação da Súmula 691, editada em 2003, não é consenso no Supremo. Para o ministro Marco Aurélio, é um erro colocar o ato do relator de um tribunal acima do ato do colegiado. Isso porque a regra não permite ao STF rever a decisão do primeiro, mas libera que a corte reveja o entendimento da turma que julgar o caso. 

Clique aqui para ler a decisão sobre executivo da Galvão Engenharia.
Clique aqui para ler decisões anteriores de Zavascki.

Processos: HC 126.877 e HC 125.555

 é repórter da revista Consultor Jurídico.

Revista Consultor Jurídico, 10 de março de 2015, 17h20

Aprovação do orçamento impositivo não dá credibilidade à lei orçamentária

CONTAS À VISTA

Aprovação do orçamento impositivo não dá credibilidade à lei orçamentária




A recente aprovação pela Câmara dos Deputados da “PEC do Orçamento Impositivo” (Proposta de Emenda Constitucional 358/2013)[1] torna oportuno voltar ao assunto, sobre o qual já discorri nesta coluna em maio de 2013, dada a importância que representa para o Direito Financeiro.

Em um ano que começou mal para o Direito Financeiro, como já destaquei recentemente[2]esta deve ser recebida como uma boa notícia.
Não darei o mesmo enfoque da coluna anterior, para a qual remeto o leitor, pois a efetiva aprovação desta emenda constitucional permite ampliar as reflexões sobre o tema, agora já à luz do texto aprovado, especialmente para esclarecer alguns pontos polêmicos que surgiram durante esse período de discussões.
A PEC promoveu alterações na redação dos artigos 165, 166 e 198 da Constituição, introduzindo modificações no sistema de execução orçamentária, com a finalidade de tornar obrigatória a realização de parte das despesas previstas na lei orçamentária. Vem integrar o ordenamento jurídico após longa tramitação de várias propostas, destacando-se a PEC 22/2000 do Senado Federal, tendo havido impulso e divulgação em 2013, com o debate sobre a PEC 565/2006 na Câmara dos Deputados.
A lei orçamentária, já reconhecida como a mais importante depois da Constituição[3], sempre enfrentou problemas com relação à concretização de seus dispositivos, dada suas peculiaridades, o que deu origem aos debates até hoje presentes sobre sua natureza “autorizativa” ou “impositiva”.
Como tenho defendido, não é coerente com o ordenamento jurídico vigente, que tem a lei orçamentária contextualizada em um sistema de planejamento governamental, na qual tem um papel fundamental, considerar serem as disposições da lei orçamentária meras “autorizações” para as despesas públicas. Acolher tal interpretação é fazer pouco desta lei tão relevante. Ainda que sejam necessários instrumentos de flexibilidade que permitam adequar as disposições da lei orçamentária às inevitáveis intercorrências que surgem no decorrer do exercício financeiro, há que se reconhecer o caráter mandatório — ou “impositivo” — da lei orçamentária.
Os principais aspectos da nova redação da Constituição estão no artigo 165, parágrafos 9º e 11, ao prever 1,2% da receita corrente líquida para as emendas parlamentares individuais ao projeto de lei orçamentária, que se tornam de execução obrigatória, ressalvados apenas impedimentos de ordem técnica, caso em que serão adotadas as medidas especificadas no parágrafo 14.[4]
Outro item importante é a destinação de metade deste montante para as ações e serviços públicos de saúde, criando uma “vinculação” de recursos ao setor. Desde já convém ressalvar que, embora louvável privilegiar área tão fundamental para assegurar o cumprimento de direitos fundamentais como o da saúde, as vinculações não são capazes por si só de resolver os problemas, como já destaquei em coluna anterior[5]
Fato é que todo e qualquer mecanismo que venha a intensificar o caráter impositivo da lei orçamentária é importante para conferir maior seriedade e gerar mais confiança aos agentes públicos e privados quanto às previsões das ações governamentais, tornando com isso mais eficiente a gestão pública. Nisto reside a principal virtude desta alteração constitucional.
Limitar essa obrigatoriedade de cumprimento da lei orçamentária às emendas parlamentares individuais é, no entanto, reduzir demasiadamente o alcance de uma medida que deveria compreender todo o orçamento público — e esta seguramente é a principal crítica a ser registrada.
A redação prevista inicialmente na PEC 22/2000 não continha essa restrição, dispondo que “A programação constante da lei orçamentária anual é de execução obrigatória, salvo se aprovada, pelo Congresso Nacional, solicitação, de iniciativa exclusiva do Presidente da República, para cancelamento ou contingenciamento, total ou parcial, de dotação” (proposta de redação ao art. 165-A da Constituição)[6], mesma redação que constava da PEC 565/2006.
Tendo em vista a sistemática adotada pelo Congresso Nacional de criar uma “cota” para as emendas parlamentares, tema sobre o qual já se falou nesta coluna[7], é em função da execução delas que se estabeleceu uma relação conflituosa entre os Poderes Executivo e Legislativo pelo comando da destinação dos recursos orçamentários. Daí porque, durante a tramitação da PEC do Orçamento Impositivo, a redação final do texto acabou por restringir a impositividade do orçamento aos valores que nele se inserem por meio das emendas parlamentares individuais, e com isto perdeu-se uma excelente oportunidade de aprovar a proposta inicial, mais abrangente.
É importante aproveitar a oportunidade do debate acerca do assunto para esclarecer muitas questões controvertidas e críticas ao orçamento impositivo e à proposta aprovada, o que se pretende fazer a seguir.
1) O orçamento impositivo “engessa” a atuação do governo e compromete a eficiência da administração
Trata-se de argumento que revela fato em parte verdadeiro. No entanto, isto deve ser visto positivamente, como qualidade e não defeito. Não há dúvida quanto a promover algum grau de “engessamento” na ação governamental, sob o ponto de vista do Poder Executivo, responsável maior pela condução da execução orçamentária. Mas não se pode afirmar que compromete a eficiência da Administração Pública.
Sendo o orçamento uma lei, aprovada para estabelecer a destinação dos gastos durante todo o exercício financeiro, o que se espera é seu fiel cumprimento, de modo que, no final do exercício, o que nele está previsto seja efetivamente executado. Reduzir a flexibilidade e diminuir a discricionariedade do Poder Executivo na execução orçamentária (“engessando-o”) é medida adequada para atingir este objetivo, que dá maior previsibilidade, credibilidade e transparência à lei orçamentária, além de segurança jurídica à Administração Pública e a toda a sociedade.
A flexibilidade é inerente ao processo de execução orçamentária, mas deve orientar-se para cumprir o estabelecido na lei orçamentária em seu aspecto essencial, limitando-se a proceder aos ajustes que se façam imprescindíveis para adaptar o orçamento às imprevisibilidades surgidas no decorrer do exercício financeiro.
Não se pode concluir que exigir o cumprimento de uma lei tal como aprovada seja motivo de ineficiência administrativa, pelo contrário. A segurança jurídica e a credibilidade conferida à lei, nessa hipótese, é razão para tornar mais eficiente a Administração Pública.
2) As emendas parlamentares atendem apenas a interesses paroquiais, desorganizam o planejamento e o orçamento, prejudicam a gestão e comprometem as políticas públicas
A redução da participação parlamentar na elaboração do orçamento às emendas parlamentares, com o sistema de “cotas” já institucionalizado, já é por si só uma grave distorção no processo orçamentário, que mitiga a importância da participação do Congresso Nacional na elaboração do orçamento federal.
Deixa-o de lado na discussão sobre a definição da alocação de recursos orçamentários para as principais políticas públicas, limitando sua participação à inserção de despesas que pouco representam, se considerado o orçamento como um todo, ainda que envolvam altas somas de dinheiro público.
Isto deturpa a atuação parlamentar, que volta suas preocupações para atender a demandas locais e específicas de setores e grupos, os chamados interesses “paroquiais”, o que tem sido duramente criticado, e não sem razão.
Algumas vezes até exageradamente, como se vê da opinião expressa pelo jornalista Fernando Rodrigues, que considerou a obrigatoriedade da execução financeira das emendas parlamentares um “desastre gerencial”, prevendo que os candidatos ao Congresso Nacional, nas campanhas eleitorais, “poderão zanzar pelas ruas com uma plaquinha pendurada no pescoço: valor: 14 milhões[8]. Em sentido semelhante escreveu Raul Velloso, que via a PEC como uma “manobra”, verdadeira “brincadeira de mau gosto” que “garantiria uma fatia de R$ 10 milhões da pizza orçamentária para cada parlamentar patrocinar algum gasto junto à sua base de apoio”[9].
Como mencionado, restringir a obrigatoriedade da execução orçamentária às emendas parlamentares individuais está longe do ideal, pois o que se espera e deseja, para dar seriedade à lei orçamentária, é que o orçamento seja cumprido tal como aprovado, e não somente no que tange às referidas emendas.
Cumpre ressaltar que as emendas parlamentares só podem ser aprovadas se compatíveis com o plano plurianual e a lei de diretrizes orçamentárias (Constituição, artigo 166, parágrafo 3º, I), e, até por representarem pequena parcela do orçamento público, não há como desorganizarem o sistema de planejamento e orçamento, nem comprometerem a gestão, bem como a implementação e execução das políticas públicas.
Evidentemente há que se exigir atuação mais responsável do Congresso Nacional, ao usar as emendas para atender o interesse público. Isto, no entanto, não pode comprometer a seriedade da lei orçamentária, nem a obrigatoriedade do cumprimento do que nela foi aprovado, o que é fundamental para dar segurança ao ordenamento jurídico.
Nem justificar a transferência do poder de decidir sobre os gastos públicos para o Poder Executivo, como se este fosse mais responsável e competente para melhor alocá-los.
3) A PEC do Orçamento Impositivo é um casuísmo
De fato, há de se reconhecer que esta PEC, nas circunstâncias em que foi aprovada, e restrita à obrigatoriedade na execução das emendas parlamentares, evidencia uma ação oportunista do Congresso Nacional, que permite entrever o interesse em tão somente priorizar o atendimento das destinações de recursos orçamentários patrocinados pelos parlamentares.  
A questão foi exposta com muita propriedade por José Marcos Domingues recentemente[10], onde deixa evidente a inadequação em se privilegiar emendas individuais dos congressistas em detrimento das políticas públicas que devem ser planejadas, refletidas e discutidas em função do bem comum.
Conforme já exposto anteriormente, é evidente que seria muito melhor a aprovação da PEC original, que estendia a obrigatoriedade da execução da lei orçamentária como um todo; no entanto, pior é não haver qualquer obrigatoriedade na execução do orçamento, dando margem à interpretação de que se trata de lei meramente autorizativa dos gastos, cuja execução se sujeita à ampla discricionariedade do Poder Executivo.
O orçamento impositivo vem valorizar a lei orçamentária, tem por finalidade conferir maior efetividade a seus dispositivos, e por isso devem ser apoiadas as ações no sentido de implementá-lo.
Por isso, é melhor olhar a restrição às emendas parlamentares não como uma medida casuística, que de fato aparenta ser, mas sim como uma medida excessivamente tímida para o que se espera, que é tornar a lei orçamentária uma norma de eficácia plena e de elevada credibilidade.   
A PEC aprovada infelizmente não foi abrangente o bastante para fazer com o que o orçamento deixe de ser uma peça de ficção, como desejou a Senadora Ana Amélia ao tratar do tema[11].
Mas a nova redação dada à Constituição é um começo. Insuficiente para dar à lei orçamentária a credibilidade e segurança jurídica que se espera da lei mais importante depois da Constituição.
É necessário avançar ainda muito mais.

[1] Câmara aprova PEC do orçamento impositivo em 2º turno. In Câmara Notícias (http://www2.camara.leg.br/camaranoticias/noticias)
[2] Coluna Direito Financeiro precisa ser levado a sério, e 2015 começou mal, publicada em 10 de fevereiro de 2015.
[3] Min. Ayres Britto, STF, ADI-MC 4048-1/DF, j. 14.5.2088, p. 92 dos autos.
[4] Art. 166. (...)
§ 9º. As emendas individuais ao projeto de lei orçamentária serão aprovadas no limite de 1,2% (um inteiro e dois décimos por cento) da receita corrente líquida prevista no projeto encaminhado pelo Poder Executivo, sendo que a metade deste percentual será destinada a ações e serviços públicos de saúde.
§ 11. É obrigatória a execução orçamentária e financeira das programações a que se refere o § 9º deste artigo, em montante correspondente a 1,2% (um inteiro e dois décimos por cento) da receita corrente líquida realizada no exercício anterior, conforme os critérios para a execução equitativa da programação definidos na lei complementar prevista no § 9º do art. 165.
[5] Vinculações orçamentárias não são a panaceia dos problemas, publicada em 8 de abril de 2014.
[6] Diário do Senado Federal, 7 de junho de 2000, p. 11983.
[7] Emendas ao orçamento e o desequilíbrio de Poderes, publicada em 3 de julho de 2012.
[8] “Desastre no manejo político”, in Folha de S. Paulo, 9 de novembro de 2013, p. A2.
[9] “Proposta inoportuna”, in Folha de S. Paulo, 10 de agosto de 2013, p. A3.
[10] Coluna Pelo controle judicial do orçamento impositivo de emendas individuais, publicada em 19 de fevereiro de 2015.
[11] “O fim da ficção”, in Folha de S. Paulo, 10 de março de 2013.
 é juiz de Direito em São Paulo, professor associado da Faculdade de Direito da USP, doutor e livre-docente em Direito Financeiro pela USP.

Revista Consultor Jurídico, 10 de março de 2015, 8h00