"Eu não recearia muito as más leis, se elas fossem aplicadas por bons juízes. Não há texto de lei que não deixe campo à interpretação.

A lei é morta. O magistrado vivo. É uma grande vantagem que ele tem sobre ela" - Anatole France

sexta-feira, 26 de dezembro de 2014

Orçamento bilionário do TJ-SP é insuficiente para fazê-lo funcionar

MUDANÇA DE PARADIGMAS

Orçamento bilionário do TJ-SP é insuficiente para fazê-lo funcionar




[Artigo originalmente publicado no jornal O Estado de S. Paulo desta quarta-feira (24/12)]

Ninguém mais duvida de que o sistema de Justiça no Brasil está em profunda crise. A excessiva judicialização gerou um acervo de 100 milhões de processos para 202 milhões de habitantes — evidência de um quadro patológico, bem distante do "termômetro democrático" dos que pretendem considerar normal essa desenfreada busca ao Judiciário.
O Tribunal de Justiça de São Paulo é o maior do mundo. Seus 55 mil funcionários, seus 2,4 mil magistrados e seus 25 milhões de processos não encontram similar no planeta. Seu crescimento reclama orçamento bilionário. Mas ainda insuficiente para fazê-lo funcionar. Enquanto o Orçamento-Geral do Estado cresceu 97% nos últimos sete anos, o da Justiça cresceu 54%. Por isso o ano de 2014 teve início com R$ 1,3 bilhão de déficit. Houve cortes em tudo aquilo que se pode contingenciar. Mas a máquina depende das pessoas que prestam o serviço e quase toda a verba do Tesouro foi destinada ao pagamento de pessoal.
Dois benefícios criados no final de 2013 teriam de ser implementados. Mas é incrível que leis de iniciativa do tribunal, que passaram pela Assembleia Legislativa e foram sancionadas pelo governo, se ressintam de falta de provisão orçamentária. Uma verdadeira acrobacia hermenêutica permitiu a aplicação da gratificação cartorária. O mesmo não se conseguiu fazer com o adicional de qualificação.
Pudemos, em relação ao funcionalismo, honrar a data-base, reajustando os salários pouco acima da inflação. Dobramos o auxílio-saúde, continuamos a indenizar os atrasados. Investimos no resgate da autoestima, com programas de revalorização, arte e cultura no tribunal, ginástica laboral, palestras de motivação e formação de coral de servidores. Celebramos muitos convênios e protocolos, para permitir a criatividade e a inovação. Iniciamos a experiência do home office, que resultou exitosa. Apoiamos o projeto Justiça Cordial, da Corregedoria-Geral, para criar um ambiente de polidez e boa educação de berço, tão em falta em tantos espaços.
Apostamos no Cartório do Futuro, que é um projeto de priorização do primeiro grau, meta do Conselho Nacional de Justiça e que permitirá a racionalização das rotinas, adoção de gestão otimizada e liberação de magistrados para realizar aquela missão para a qual eles foram preordenados pelo sistema: decidir. A administração será confiada, por rodízio, a um deles, num grupo de dez juízes, dos quais se espera um exponencial crescimento na produtividade.
Criamos a Escola Judicial de Servidores, uma legítima exigência do quadro funcional. Escola com verdadeiros cursos, para que nossos funcionários possam aprimorar seus conhecimentos, sobretudo em relação às tecnologias de informação e comunicação, pois o processo eletrônico é irreversível.
Cada vez que me defronto com a obrigatoriedade de armazenar mais de 85 milhões de feitos findos, sem condições de descartá-los, sob argumento de que possam ser históricos, lamento pelo povo paulista, que despende milhões de reais para guardar papel velho. Muitos de nós não têm a climatização reservada a esse arquivo. Num cotejo de custo/benefício para o interesse da população, não consigo sustentar o acerto da normatividade que obriga o TJ-SP a manter o acervo tal como está. Ainda mais considerado o acréscimo de mais 25 milhões de processos atualmente em curso.
Foi por pensar no futuro da Justiça que formei o Conselho Consultivo Interinstitucional, um organismo de consulta para a sociedade civil — quem sustenta o Judiciário — que tem o dever de participar das discussões em torno da reforma do sistema. Tenho reafirmado que, se a população pretender continuar a manter essa direção, que prepare seu bolso, pois a Justiça tem expertise em crescer até o infinito.
Mas o TJ-SP está fazendo sua parte. Já foram instalados 120 Centros Judiciais de Solução de Conflitos e Cidadania (Cejuscs). Eles existem para propiciar a conciliação extrajudicial de pequenas questões que não precisam se socorrer do sofisticado, dispendioso e lento Poder Judiciário. É urgente que o Brasil crie uma cultura de pacificação, de harmonização e de diálogo. Não só para desafogar a Justiça, mas para treinar a formação de uma cidadania madura, capaz de enfrentar seus problemas de acordo com o princípio da subsidiariedade. Se assim não for, nunca chegaremos à democracia participativa prometida pelo constituinte de 1988.
As perspectivas da economia brasileira não são as melhores para 2015. Tenho acenado com a continuidade de uma política austera. Os impactos financeiros de novas criações, instalações, ampliações e quetais não têm prognóstico favorável. Por isso, é preciso pensar em criatividade. É urgente dotar o fundo constituído para aperfeiçoamento da Justiça de mais recursos financeiros. Outros Estados têm a destinação integral das custas e dos emolumentos para a Justiça. Isso já está na Constituição da República, e em São Paulo não é cumprido.
Mas também é preciso cobrar da União aquilo que a Justiça Estadual faz em seu lugar, sem nenhuma contraprestação. As novas execuções fiscais de interesse da União já não virão para o foro estadual. Mas, por enquanto, o TJ-SP é o segundo maior Tribunal Federal do país, só superado pelo TRF da 3ª Região. Basta verificar o número de execuções fiscais da União e as ações previdenciárias remetidas aos juízes estaduais, nas comarcas desprovidas de Justiça Federal.
Também os municípios sobrecarregam a Justiça Estadual de suas cobranças de dívida ativa e não remuneram o Judiciário por esse serviço. Enquanto não se liberar a Justiça dessa função de cobradora, é preciso que ela receba um ressarcimento. Disso se cuidará em 2015.
O TJ-SP precisa da população e, mais ainda, da Assembleia Legislativa, por onde tramitam projetos de interesse efetivo rumo ao aperfeiçoamento do Judiciário e do Poder Executivo estadual. Justiça é serviço essencial, cresceu diante da demanda exagerada, mas não pode ser interrompida antes de submetida a uma profunda reforma estrutural, ainda mera promessa num Brasil de tantas urgências na mudança de paradigmas.
José Renato Nalini é presidente do Tribunal de Justiça de São Paulo.

Revista Consultor Jurídico, 24 de dezembro de 2014, 14h35

Empresa pública que obriga servidor a tirar licença prêmio comete assédio moral

RETORNO AO TRABALHO

Empresa pública que obriga servidor a tirar licença prêmio comete assédio moral





Empresa pública que obriga servidor a tirar licença prêmio comete assédio moral, e deve pagar indenização ao funcionário. Assim concluiu a Turma Recursal de Juiz de Fora (MG) ao manter sentença que havia condenado a Empresa Municipal de Pavimentação e Urbanização (Empav) a readmitir um engenheiro agrônomo no trabalho e a reparar os danos morais causados a ele.
O servidor moveu ação alegando que, desde julho de 2013, tem sido vítima de assédio moral, pois foi forçado a tirar licença prêmio por quatro meses e, quando voltou ao trabalho, em outubro de 2013, foi novamente obrigado a usufruir de mais quatro meses da mesma licença, tendo se recusado a assinar a comunicação desse segundo período. Por isso, pleiteou o retorno imediato às suas funções, bem como uma indenização pelo assédio moral sofrido.
Em defesa, a Empav alegou que a licença prêmio concedida foi legal e que a oportunidade e conveniência desse direito é ato privativo do seu diretor presidente. Mas o juízo de primeira instância deu razão ao funcionário público e declarou ilegal a licença prêmio concedida a partir de novembro de 2013, determinando o retorno imediato do empregado ao trabalho. A empresa foi condenada ainda a pagar indenização por dano moral no valor de R$ 93 mil.
A empresa pública recorreu da sentença. Contudo, a Turma Recursal de Juiz de Fora manteve a condenação, apenas reduzindo o valor da indenização.
Para a juíza relatora convocada, Maria Raquel Ferraz Zagari Valentim, o empregador tem legítimos poderes diretivo, administrativo e disciplinar. Mas o exercício desses poderes é delimitado pelo respeito à dignidade do empregado, sendo passível de reparação qualquer atitude do empregador que diminua a condição e prestígio moral do trabalhador.
Em seu voto, a relatora define assédio moral como "a situação de violência psicológica intensa sobre o empregado, prolongada no tempo, que acaba por ocasionar, intencionalmente, dano psíquico, marginalizando-o no ambiente de trabalho". Maria ressalta que, para que se configure o dano indenizável, tem de haver prova cabal do tratamento discriminatório e rigoroso do superior hierárquico sobre a vítima.
Analisando as normas contidas no Plano de Cargos, Carreiras e Salários (PCCS), estabelecido entre a Empav e o sindicato da categoria, a juíza convocada concluiu que esses dispositivos não atribuem à empresa a faculdade de conceder a licença prêmio ao empregado, ficando claro que esse é um direito a ser exercido por cada trabalhador.
"Note-se que em nenhum momento se extrai da referida norma (artigo 25 do PCCS) a possibilidade de concessão ex officio pela administração", apontou a relatora do caso.
No entender de Maria, ficou caracterizada a violência psicológica contra o engenheiro, tendo em vista a conduta abusiva da ré ao lhe impor o gozo da licença prêmio e a ociosidade, de modo a afastar o empregado do ambiente de trabalho. Frisou que o ato do empregador foi arbitrário, não encontrando respaldo no PCCS.
A relatora deu razão à empregadora apenas quanto ao valor da indenização arbitrado pela primeira instância, considerado desproporcional à ofensa. Acompanhando o entendimento, a Turma Recursal deu provimento parcial ao recurso da ré, reduzindo o valor da indenização por danos morais para R$ 30 mil. Com informações da Assessoria de Imprensa do TRT-3.
Clique aqui para ler a decisão da Turma Recursal de Juiz de Fora.
Processo 0001673-54.2013.5.03.0037/RO

Revista Consultor Jurídico, 24 de dezembro de 2014, 10h35

quarta-feira, 24 de dezembro de 2014

ADPF afirma que MP quer dominar a Polícia Federal

COMBATE CORRUPÇÃO

ADPF quer prioridade no combate à corrupção e diz que MP quer dominar a Polícia Federal


Presidente da ADPF, Marcos Leôncio Ribeiro foi o entrevistado


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  • Blog Matheus Leitão
   

Em meio ao maior escândalo de corrupção do Brasil, em que a Polícia Federal tem tido um papel fundamental, o presidente da Associação Nacional dos Delegados de Polícia Federal (ADPF), Marcos Lêoncio Ribeiro, diz que “o orçamento público ainda não elegeu como prioridade uma estratégia nacional de enfrentamento à corrupção”.

Leôncio afirmou, em entrevista ao blog, que o dinheiro está focado “fundamentalmente no conceito de ‘guerras às drogas'”. “O que se defende [agora] é priorizar o combate aos crimes financeiros e ao desvio de recursos públicos como investigações sensíveis e especiais na Polícia Federal”. Ele lembra que a PF é órgão de Estado. “Aos poucos a classe política vai compreendendo que a Polícia Federal não faz parte desse mundo de aliados e adversários”.

Leôncio Ribeiro faz duras criticas ao Ministério Público, responsável pelo controle externo da atividade policial. Segundo ele, o MP quer uma PF “subjugada e dominada”. “Hoje a maior de todas as ameaças à autonomia da Polícia Federal vem do Ministério Público Federal, seja por parte da própria instituição seja por sua entidade de classe”, disse ele.
“Sob a sutileza do exercício do controle externo da atividade policial, o MPF quer uma Polícia Federal subjugada e dominada. Um simples braço operacional da vontade ministerial, sem direito a pensar ou discordar. Que somente dever se reportar ao MPF”, afirmou Leôncio. Leia a íntegra da entrevista abaixo:

Qual o balanço que o senhor faz do trabalho da Polícia Federal no ano de 2014?

O ano de 2014 fecha um ciclo positivo no enfrentamento à corrupção que se iniciou com o julgamento do chamado mensalão até a operação lava jato. A prisão de políticos, banqueiros e executivos de grandes empreiteiras tem um significado importante na luta contra a impunidade no país. É importante para o fortalecimento das instituições republicanas e o desenvolvimento da democracia no Brasil.

O senhor acha que as investigações da Polícia Federal foram utilizadas politicamente como forma de ataque a candidatos nas últimas eleições? Como o senhor vê o uso político das investigações?

Com naturalidade, isso já havia ocorrido nas eleições gerais anteriores com a Polícia Federal ocupando espaço importante nos programas eleitorais dos candidatos. A novidade ficou por conta dos ânimos mais exaltados deste pleito que potencializou a salutar discussão política sobre o papel da Polícia Federal como órgão de Estado com autonomia para investigar fatos, sem perseguir ou proteger pessoas e partidos. No mundo da política, a tendência é atribuir aos adversários os fatos. Aos poucos a classe política vai compreendendo que a Polícia Federal não faz parte desse mundo de aliados e adversários. Ela simplesmente faz o seu trabalho.

Com a aprovação da medida provisória 657, garantindo que o diretor-geral é obrigatoriamente quadro de delegado especial, isso dará ainda mais poderes aos delegados?

A lei 13.047 de 2014 simplesmente reafirma os preceitos constitucionais de que uma instituição verdadeiramente republicana requer dirigentes escolhidos por critérios técnicos dentre servidores de carreira do mais elevado grau de hierarquia da respectiva organização. Quem saiu fortalecida foi a instituição Polícia Federal. Muitos outros órgãos públicos federais vão se espelhar nesse precedente para garantir mais profissionalismo ao serviço público.

A partir de agora a OAB participará da banca examinadora para concurso da Polícia Federal. O concurso ficará mais qualificado?

A participação da OAB traz uma simbologia relevante. O papel da ordem na redemocratização do país e sua missão em defesa dos direitos humanos são fundamentais para uma polícia moderna comprometida com os valores democráticos e a dignidade da pessoa humana. A presença da OAB qualifica o trabalho da Polícia Federal, quando se quer demonstrar, ao contrário do que pensa o Ministério Público, ser possível sim realizar investigação criminal neste país com a colaboração da advocacia. Exemplo disso foi o jurista Márcio Thomaz Bastos que atuou na defesa, tanto no mensalão, quanto na operação lava jato. Enquanto Ministro da Justiça e advogado criminalista sempre tentou fazer as pessoas próximas a si compreender o papel da Polícia Federal como órgão de Estado.

A autorização para fazer novos concursos, sem a necessidade de análise orçamentária do Ministério do Planejamento, resolverá de uma vez por todas a questão de problemas com efetivo? A sociedade não ouvirá mais a reclamação da categoria nesse sentido?

O decreto 8326 de 2014 é um avanço institucional por colocar na ordem de prioridade da análise orçamentária do governo federal a realização de concursos públicos na Polícia Federal. Não temos a ilusão de que a questão do efetivo policial seja resolvida por decreto. Igualmente utópico é imaginar que num país continental com tantas tríplices fronteiras complexas e cada vez mais inserido na globalização haverá um efetivo policial ideal. O que se reclama é segurança, estabilidade, regras claras e objetivas para um planejamento adequado da gestão de pessoas a curto, médio e longo prazo. É ao menos planejar a relação ingresso/vacância no quadro funcional da Polícia Federal. A respeito de reclamação, haverá cobrança por concursos públicos para servidores administrativos, cujo suporte às atividades policiais é imprescindível, mas infelizmente não foram contemplados no referido decreto.

Desde o primeiro mandato, a presidente Dilma Rousseff tem falado que vai dar mais atenção para as fronteiras brasileiras. O senhor acredita que ela cumpriu a promessa? A polícia Federal hoje tem condições e efetivo para controlar a entrada de drogas e armas nas fronteiras?

É inegável que o orçamento público nos últimos quatro anos priorizou os recursos para a estratégica nacional de segurança pública nas fronteiras (Enafron). Ocorre que controle de fronteiras no mundo globalizado é algo tão complexo quanto à discussão que se faz sobre a “guerra às drogas”. Esse debate sobre a eficiência do Estado é feito aqui e vários outros países com fluxo migratório e circulação de bens crescentes. Os Estados Unidos e União Européia, por exemplo, gastam orçamentos elevados com efetivo e fiscalização ainda assim os problemas são os mesmos enfrentados no Brasil. Em todos eles a realidade revela que isso não é missão para um só organismo. As diretrizes são cooperação internacional, integração dos órgãos internos, inteligência e comprometimento sócio-econômico de todos.

Hoje o trabalho da Polícia Federal é mais voltado ao combate ao narcotráfico. O senhor acha que o trabalho da PF deve ser mais centrado no combate ao narcotráfico ou à corrupção?

A Polícia Federal se adapta à realidade orçamentária. Com a Enafron os recursos disponibilizados foram destinados aos Grupos de Investigações Sensíveis e Especiais, conhecidos pela sigla Gise. Eles são focados fundamentalmente no conceito de “guerras às drogas”. Infelizmente, o orçamento público não elegeu ainda com a mesma prioridade uma estratégia nacional de enfrentamento à corrupção. O que se defende é priorizar o combate aos crimes financeiros e ao desvio de recursos públicos como investigações sensíveis e especiais na Polícia Federal. Aliás, em regra, os caminhos do narcotráfico e da corrupção se cruzam na lavagem de dinheiro. Por exemplo, na lava jato também se apurou a participação de traficantes com doleiros.

O efetivo da Polícia Federal está envolvido em muitos serviços burocráticos, como é o caso do controle de imigração nos aeroportos. O senhor acha que o trabalho não deveria estar mais voltado à atividade fim, ou seja, as investigações?

A Polícia Federal tem constitucionalmente como atividade-fim a polícia judiciária (investigações) e a polícia administrativa (fiscalização/segurança). Nos últimos quatro anos, como exemplo de atividades investigatórias, podemos citar as operações porto seguro, monte carlo e lava jato. A título de exemplo da outra atividade inerente, a entrada/saída de estrangeiros nos aeroportos internacionais e a segurança do papa na jornada mundial da juventude e das seleções na copa do mundo. Creio que ambos os trabalhos são reconhecidos pela sociedade brasileira. Todavia, na falta de condições ideais para atender ambas, é preciso priorizar de forma diferenciada. Durante o VI Congresso Nacional dos Delegados de Polícia Federal, deliberou-se que embora a atividade-fim de polícia administrativa não se justifica em si, ela deve ser complementar da vocação institucional de polícia judiciária. O controle de imigração nos aeroportos deve ser instrumento a serviço das investigações da Polícia Federal. Em suma, são atividades com grau de prioridade diferenciado para efeito de planejamento, organização e funcionamento do órgão.

O senhor acredita que a escolha do diretor da Polícia Federal deve passar por uma lista tríplice? E o Congresso aprovar um mandato de dois anos, com mais estabilidade, caso do FBI, nos Estados Unidos?

O sistema de lista é uma prática comum em países democráticos nas mais diversas áreas inclusive na gestão de pessoas. Traz o mérito de permitir a decisão política dentro de um contexto com parâmetros técnicos. A escolha pela Presidência da República de um Diretor-Geral mediante lista, a priori diminui interferências indevidas, pois, institucionaliza um método cuja legitimidade interna corporis já irá permitir ao dirigente escolhido maior segurança e estabilidade na sua gestão.

Vários outros pontos são ainda possíveis de agregar mais caráter republicano à instituição. O mandato e a sabatina são exemplos. O mandato não significa que o Diretor-Geral não possa ser exonerado. O Corregedor-Geral da Polícia Federal possui mandato, nem por isso significa que nas hipóteses previamente estabelecidas, ele não possa ser substituído. Há algo mais republicano que o dever de prestação de contas de forma transparente aos Poderes da República Será que queremos uma Polícia Federal a prestar contas apenas ao Ministério da Justiça? Por intermédio da sabatina e da participação em audiências no Congresso Nacional, acompanhadas pela imprensa e opinião pública, o controle social pode ser exercido sobre as atividades da Polícia Federal como é desejável numa democracia. O que, aliás, já ocorre com órgãos de inteligência e diplomáticos no âmbito federal.

A Polícia Federal no Brasil ainda precisa de mais autonomia para se manter, cada vez mais, uma polícia do Estado ou o nível de independência hoje o satisfaz?

A autonomia da Polícia Federal é uma construção inacabada. Requer uma eterna vigília. Está vinculada ao grau de desenvolvimento da democracia e da república no Brasil. Sujeita, portanto a avanços e retrocessos. Somente o controle social exercido pela opinião pública, uma imprensa verdadeiramente livre e garantias legais são capazes de dotar a Polícia Federal da necessária autonomia.

As ameaças sempre existirão. Haverá quem queira indicações políticas e partidárias para “controlar” a Polícia Federal. Os contingenciamentos e as limitações orçamentárias a impedir o funcionamento regular da instituição. Todavia, as piores são aquelas tão sutis que fogem à percepção da sociedade. Por exemplo, não eleger prioridades; desvios de finalidades; sobrecarregar de trabalho o órgão.

Hoje, porém, a maior de todas as ameaças à autonomia da Polícia Federal vem do Ministério Público Federal seja por parte da própria instituição seja por sua entidade de classe. Sob a sutileza do exercício do controle externo da atividade polícial, o MPF quer uma Polícia Federal subjugada e dominada. Um simples braço operacional da vontade ministerial, sem direito a pensar ou discordar. Que somente deve se reportar ao MPF.

A Polícia Federal enquanto Polícia Judiciária se ressente cada vez mais de controle jurisdicional como é feita de forma maestral pelo Juiz Sérgio Moro na operação lava jato. O MPF ergueu uma verdadeira muralha entre a Polícia Federal e o Poder Judiciário com a finalidade de transformá-la na “Polícia Ministerial”. Orientações institucionais do MPF, deliberadas em resorts paradisíacos, estabelecem, contra a lei, que a Polícia Federal não pode mais se dirigir diretamente ao magistrado. O trabalho policial deve ser submetido à prévia triagem do órgão ministerial, que saberá dizer o que pode ou não ser conhecido pelo juiz e pela defesa.

Hoje, o Ministério Público Federal requisita o arquivamento de investigações policiais sem o conhecimento do Judiciário. Proíbe a Polícia Federal de investigar, sem sua prévia autorização, as autoridades com prerrogativas de função, principalmente fatos envolvendo políticos e partidos. Orienta que, independentemente das razões expostas pela Polícia Federal, deve opinar pelo indeferimento das representações feitas diretamente ao Judiciário. E o mais grave, recomenda o plágio de peças da Polícia Federal na confecção de seus pedidos junto ao Poder Judiciário.

E é importante que se diga: a autonomia da Polícia Federal só será preservada mediante múltiplos controles finalísticos. É dever de uma Polícia Republicana prestar contas ao maior número possível de controles sociais, de forma clara, objetiva e transparente. Por outro lado, existir um único controle sob a atividade policial, não é fiscalização. É dominação!

Acessado e disponível na Internet em 24/12/2014 no endereço - 
http://www.adpf.org.br/adpf/admin/painelcontrole/materia/materia_portal.wsp?tmp.edt.materia_codigo=7228&tit=ADPF-quer-prioridade-no-combate-%E0-corrupcao-e-diz-que-MP-quer-dom#.VJoD1l4CA