"Eu não recearia muito as más leis, se elas fossem aplicadas por bons juízes. Não há texto de lei que não deixe campo à interpretação.

A lei é morta. O magistrado vivo. É uma grande vantagem que ele tem sobre ela" - Anatole France

quinta-feira, 26 de fevereiro de 2015

Honorários podem ser reduzidos por juiz se cláusula for abusiva

ATÉ 30%

Honorários podem ser reduzidos por juiz se cláusula for abusiva




Na hora de decidir sobre o destaque de honorários, o juiz não pode examinar o contrato entre cliente e advogado apenas sob o ponto de vista de sua legalidade. Deve também apreciá-lo à luz dos princípios da boa-fé objetiva, da boa-fé contratual e da vedação ao enriquecimento sem causa. Afinal, o próprio Estatuto de Ética e Disciplina da Ordem dos Advogados do Brasil, em seu artigo 36, prevê que os honorários advocatícios devem ser pactuados com moderação. O fundamento, com base na jurisprudência, levou o Tribunal Regional Federal da 4ª Região a acatar, em parte, recurso de um advogado paranaense, inconformado com o indeferimentodo destaque de seus honorários na fase cumprimento de sentença de uma ação previdenciária.
No primeiro grau, a juíza-substituta Thais Sampaio da Silva, da 1ª Vara Federal de Curitiba, reconheceu que o destaque — previsto no artigo 22, parágrafo 4º, do Estatuto da Advocacia (Lei 8.906/94) — é direito subjetivo do advogado. No entanto, indeferiu o pedido na requisição de pagamento de sua cliente, porque o contrato prevê honorários de 40% — 30% acordado para atuação no primeiro grau e 10% em grau recursal. ‘‘A jurisprudência, no entanto, consolidou que o patamar de 30% é o limite máximo razoável referente aos honorários contratuais’’, explicou. Ela se apoiou num precedente do ministro Massami Uyeda, do Superior Tribunal de Justiça, em julgamento ocorrido em fevereiro de 2011 (REsp 155.200/DF).
No Agravo de Instrumento manejado contra esta decisão, o advogado alegou que a juíza invadiu, de forma indevida, o acordo feito com a cliente, ‘‘visto que, em nenhum momento, se está discutindo o percentual, mas apenas o destaque dos honorários previamente estabelecidos em contrato’’.
O relator do recurso, desembargador Carlos Eduardo Thompson Flores Lenz, da 3ª Turma, afirmou que não era o caso de indeferir totalmente o destaque, mas de limitá-lo a 30% do montante. Assim, os 10% que excederam este percentual devem ser buscados diretamente com o cliente, sem reserva. Em socorro do seu entendimento, citou a jurisprudência do desembargador Celso Kipper, que atua na 6ª Turma do TRF-4.
Diz Kipper, ao finalizar seu voto no Agravo 00.072.268.720.124.040.000, julgado em 18 de setembro de 2013: ‘‘Resumindo, tem-se a respeito do tema o seguinte panorama: a regra geral é a não intervenção do Poder Judiciário no contrato de honorários advocatícios. Contudo, tenho que se deve admitir a limitação do destaque da verba honorária contratual, até mesmo de ofício pelo juízo da execução, naquelas situações em que se mostrar imoderado o montante contratado, tendo como parâmetro máximo para tal verificação a impossibilidade de que a demanda resulte mais benéfica ao advogado do que ao próprio cliente’’. A decisão monocrática do desembargador Thompson Flores foi tomada na sessão do dia 19 de fevereiro.
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quinta-feira, 19 de fevereiro de 2015

Caso nos EUA expõe riscos da delação premiada, dizem especialistas

BASE FRÁGIL

Caso nos EUA expõe riscos da delação premiada, dizem especialistas





"Quem pode comprar a liberdade com a palavra dirá a palavra que quiserem ouvir". A afirmação é do advogado Arnaldo Malheiros Filho (foto), do Malheiros Filho, Meggiolaro e Prado Advogados, ao comentar o caso nos Estados Unidos em que um assassino teve sua imunidade garantida após delatar uma inocente. De acordo com especialistas consultados pela revista Consultor Jurídico, o caso mostra os perigos da delação premiada e reforça o entendimento de que os depoimentos não devem ser a única base para uma condenação, conforme já decidiu o Supremo Tribunal Federal.

Na história ocorrida nos EUA, os exames de DNA provaram a inocência de uma mulher, depois de ela passar 13 anos na prisão. E que o verdadeiro culpado era seu ex-namorado. No entanto, os promotores não puderam processá-lo, porque haviam garantido a ele imunidade, em troca de seu testemunho contra ela no julgamento.
Para a advogada Sônia Ráo, do Ráo, Pires e Chaves Alves Advogados, "o inusitado dessa notícia — e o impacto que ela provoca — reside no fato de retratar um acontecimento verídico. Não estamos diante de uma discussão teórica sobre os vários aspectos que envolvem o instituto da delação premiada. É a realidade se sobrepondo às suposições, e nos lembrando que as delações são feitas por seres humanos, com todas as suas imperfeições. Desacompanhadas de provas sólidas, podem sim causar impunidade, injustiças e tragédias".
Incompetência do Estado

Para o jurista Lenio Streck a delação premiada é uma resposta "eficientista" para o problema da incompetência do Estado em combater o crime. Ou, como ele mesmo define, um modo de cortar caminho. "É como as universidades que, em vez de colocarem professores competentes, dão aos alunos a possibilidade de delatar seu professor sem se identificar. É o incentivo para que os alunos não assumam suas responsabilidades", compara. 

Segundo Streck, o caso noticiado pela ConJur não é incomum pois o mote aplicado nessas situações é o de que os fins justificam os meios. "É o utilitarismo penal. Só que as vezes os fins são falsos. Pode haver vingança por parte do delator. E até pode fazer chantagem. Há pouco controle sobre a delação nos EUA. O controle maior é o das eleições do Procurador, na maioria dos casos".  No Brasil, o jurista aponta que a delação vem apresentado problemas, como, por exemplo, as informações do delator serem desmentidas pelos delatados.
A falta de controle a delação premiada faz o jurista levantar uma série de questões: "Poderia o delator receber prêmios (já que é esse o nome do instituto) sem que a finalidade tenha efetivo fundamento? Qual é o controle sobre o objeto das delações? E se não forem confirmadas? Basta um depoimento para condenar alguém? Por exemplo, nos EUA o testemunho foi suficiente. O delator tem presunção de veracidade? Por que, por exemplo, alguém que poderia ser condenado a 200 anos recebe uma benesse de uma pena de menos de cinco anos? E por que não dez anos? Qual é o critério? Qual é o tamanho da régua do MP? Qual é o controle social sobre as delações? Em um país que até hoje não conseguiu criar critérios para aplicar a insignificância no furto, por que acreditar que conseguiremos construir critérios para controlar a delação premiada?," conclui.
Outras provas

O criminalista Alberto Zacharias Toron (foto), do Toron, Torihara & Szafir Advogados, afirma que o caso americano demonstra com clareza os perigos de se alicerçar uma condenação com base apenas na delação. "Não por acaso, o Pleno do nosso Supremo Tribunal Federal tem importante precedente indicando que 'a delação de corréu e o depoimento de informante não podem servir como elemento decisivo para a condenação, notadamente porque não lhes são exigidos o compromisso legal de falar a verdade' (AP 465/DF, rel. Min. Carmén Lúcia, DJ 30/10/2014)", lembra. 

Na opinião de Toron, a decisão do Supremo é clara no sentido de que não se pode confiar na delação sem outros elementos de prova. Entretanto, para ele, o que o ocorre nas ações penais, como a operação "lava jato", é exatamente o contrário. "Há caso em que se processa determinada pessoa porque produziu notas fiscais para viabilizar pagamentos de propina, mas outra pessoa, com conduta idêntica, vem a ser ouvida como testemunha e, no Brasil, do quanto se saiba, a outorga deste tipo de imunidade processual não tem lugar. O princípio da obrigatoriedade é o que vigora entre nós", complementa Toron, que defende executivos da empreiteira UTC Engenharia na "lava jato". 
O advogado Rodrigo Dall'Acqua(foto), sócio do Oliveira Lima, Hungria, Dall'Acqua e Furrier Advogados, aponta que é preciso cautela no uso da colaboração premiada. "Qualquer testemunho prestado por meio de recompensa deve ser ser visto com extrema cautela pelo Judiciário e nunca, jamais, pode servir de base para uma condenação criminal. O Estado deve saber que sempre pode estar sendo ludibriado ao barganhar com um criminoso que busca benefícios legais."

No entendimento do promotor de Justiça André Luis Mello há um erro técnico restringir a 'colaboração premiada' apenas à delação, pois ela atualmente engloba também a confissão. "Ou seja, não é apenas delatar outros, mas confessar. O primeiro passo para alguém querer ser 'ressocializado' é confessar seus pecados (crimes). A Lei fala atualmente em colaboração premiada e não apenas em delação premiada".


Revista Consultor Jurídico, 18 de fevereiro de 2015, 14h36

Sistema de precatórios vive hoje uma crise pronunciada

DÍVIDAS PÚBLICAS

Sistema de precatórios vive hoje uma crise pronunciada, diz Gilmar Mendes





"O sistema de precatórios vive hoje uma crise pronunciada. Acredito que resolver o problema é uma das mais iminentes tarefas da nossa geração". Assim afirmou o ministro do Supremo Tribunal Federal Gilmar Mendes durante sua palestra no II Encontro Nacional de Precatórios. O evento aconteceu nos dias 11 e 12 de fevereiro.
O ministro traçou um breve histórico das decisões da corte sobre o tema e falou sobre as dificuldades que o STF encontrou para modular os efeitos da inconstitucionalidade da Emenda 62. Para ajudar o Supremo nesta tarefa, o ministro pediu que os participantes encaminhassem colaborações ao STF. Um levantamento do CNJ de 2014 apontou que União, estados e municípios somam dívida de R$ 97,3 bilhões. 
O II Encontro Nacional de Precatórios foi promovido pelo Conselho Nacional de Justiça em parceria com o TJ-SP e com a Escola Paulista da Magistratura (EPM). O evento reuniu gestores de precatórios de todo o país que discutiram soluções para o pagamento das dívidas do setor público reconhecidas pela Justiça.
O vice-presidente do Fórum Nacional de Precatórios (Fonaprec), conselheiro Guilherme Calmon, destacou o case apresentado pelo TJ-SP. Em 2012, a corte paulista estruturou um setor com cerca de 120 servidores e com a participação de representantes estaduais e municiais para pensar em acordos para o pagamento de precatórios.
"É muito positivo em relação ao que vinha acontecendo até hoje. O sistema está funcionando e, mesmo no aguardo da modulação de efeitos da decisão do STF, todos continuam trabalhando. Hoje, os integrantes do estado que reúne 60% dos precatórios do país estão realizando os pagamentos", apontou.
Reforma da Resolução 115
Presidente do Fonaprec, a conselheira Ana Maria Amarante informou que o grupo vai apresentar à Presidência do CNJ a minuta para reforma da Resolução 115, que trata da gestão de precatórios no Poder Judiciário. A conselheira lembrou que o texto atual precisa de revisão porque foi pensado antes de o STF declarar, em 2013, a inconstitucionalidade parcial da Emenda 62/2009, que criou diversas regras com a intenção de flexibilizar e viabilizar o pagamento das dívidas pelos entes estatais.

"Mesmo com a pendência da modulação dos efeitos pelo STF, já é possível atualizar a resolução do CNJ. O fato é que um dia haverá necessidade de novas normas, e essas mudanças não se fazem de um dia para o outro", argumentou a conselheira. Ela também defendeu o fortalecimento dos comitês gestores de precatórios nos estados, destacando a importância de seu viés democrático com a participação dos diversos atores envolvidos.
Precatório Eletrônico
Uma das novidades do encontro foi a apresentação do modelo experimental do Precatório Eletrônico. O sistema está em fase de testes no primeiro e segundo grau do Tribunal de Justiça do Distrito Federal e no Tribunal Regional Federal da 5ª Região e deverá ser compartilhado como módulo do Processo Judicial Eletrônico nacional (PJe). A expectativa é de que o lançamento ocorra no dia 12 de junho.

Outra novidade foi a divulgação da fase final de desenvolvimento do Mapa Anual de Precatórios. Estipulado em 2010 pela Resolução 115, o mapa começou a tomar forma no ano passado, quando o CNJ finalizou um sistema que permite aos tribunais informar detalhes sobre a movimentação dos títulos. "Embora seja necessário refinar alguns dados, percebemos a boa vontade dos tribunais em colaborar", disse o gestor do projeto e diretor do Departamento de Acompanhamento Orçamentário do CNJ, Antonio Carlos Stangherlin Rebelo. Com informações das Assessorias de Imprensa do TJ-SP e CNJ.


Revista Consultor Jurídico, 18 de fevereiro de 2015, 12h36