"Eu não recearia muito as más leis, se elas fossem aplicadas por bons juízes. Não há texto de lei que não deixe campo à interpretação.

A lei é morta. O magistrado vivo. É uma grande vantagem que ele tem sobre ela" - Anatole France

quinta-feira, 26 de março de 2015

E o juiz decretou a prisão marcando um "X"! Sentença ou quiz show?

SENSO INCOMUM

E o juiz decretou a prisão marcando um "X"! Sentença ou quiz show?



caricatura lenio luis streck 02 [Spacca]

Circula nas redes — vi no Facebook do Aury Lopes Jr. — uma decisão de um juiz de direito apaguei o seu nome a Comarca, porque o que interesse é o fenômeno e não a pessoa  em que ele decreta a prisão preventiva em um formulário padrão, em que as alternativas de “fundamentação” (as aspas indicam ironia, ok?) são os dizeres do artigo 312 do CPP. Ei-la:

E ele tascou um X nas alternativas garantia da ordem publica e assegurar a aplicação da lei penal. Simples assim. Não há referência a um caso concreto específico. Há um formulário que fala de um tipo de crime. Incrível. Trata-se da ontoteologização do direito. O juiz achou o que os filósofos procuram há dois mil anos: o “ser em geral”. A substância de todos os crimes. A essência da prisão preventiva. Sabendo-se a essência, sabe-se tudo. Trata-se de algo como se passa na Novela do Curioso Impertinente, de Cervantes, em que o personagem Anselmo procura a essência de fidelidade.
Quando li essa decisão fiquei pensando em fugir para as montanhas. Pindorama é assim. Quando se cava um buraco e se chega lá embaixo, o que encontramos? Marque um X na alternativa “uma pá” para cavar mais fundo. E acertou. Pergunto-me: o que está acontecendo com o Direito em terrae brasilis? A estandardização e a literatura prêt-à-porter, prêt-à-parler e prêt-à-penser levou os juristas a esse patamar? Tenho a certeza que sim. Minhas perguntas são retóricas.
O que vale a liberdade de uma pessoa? Pode ela ser perdida por prisão preventiva marcada por um X, sem qualquer fundamentação ou referência ao fato concreto, como se fosse um quiz show? Juízes não tem responsabilidade política? Então a aplicação da lei virou isso? Aliás, agora me dou conta de que não faltou inspiração ao juiz.  Na Polícia Civil em vários Estados já existe o mesmo tipo de formulário para pedir as medidas protetivas da Lei Maria da Penha! Na Justiça do Trabalho a maioria dos pedidos também é apresentada em formulários. E se a ideia pega, poderíamos transformar tudo em formulário. O promotor marca um X no artigo violado! Para que descrever conduta típica? Para que fundamentar a decisão? Assim a justiça fica mais rápida alguns dirão, como se esse fosse o objetivo do Estado Democrático de Direito! Sim, sei que a decisão essa é de 2011. Não importa. Nem sei se esse procedimento era praxe. De todo modo, não está “prescrito” o episódio. O que importa, aqui, é discutir o simbólico. Com ele  o simbólico  podemos capturar o imaginário de determinados juristas.   
Essa nem o leitor que se assina Prætor e que critica todas as minhas colunas poderá defender (aliás, fico imaginando às quintas-feiras de manhã: Prætor levanta tremendo, emocionado... abre a ConJur e tasca seu comentário, em uma espécie de gozo fundamental; sem o Prætor, Senso Incomum não seria o que é!). E não sou só eu que penso assim! Registre-se o comentário bem-humorado do comentarista Alexandre Carvalho Simões (Advogado Autônomo - Criminal) na coluna do dia 19/03 (Abstraindo, é claro, o encaminhamento que dá ao meu segundo modelo de juiz):
“Praetor me fez lembrar de um versículo da bíblia: Saulo, Saulo porque me persegues? Todo mundo sabe que Saulo se tornou Paulo e que Paulo foi o maior apóstolo de Cristo. Assim será o Praetor, o maior apóstolo de Lenio Streck. Dizem que amor e ódio andam de mãos dadas... [...]”.
Destarte, se haverá a conversão do nosso Prætor, não sei. Mas pela fama que já alcança nosso interlocutor, esperamos a edição de um “(des)compreender direito: comentários críticos à coluna senso incomum”.  Talvez me force à tréplica, com um “Verdade e Implicância”.
Sigo. E para dizer que é despiciendo falar mais sobre essa “decisão” (Novamente entre aspas. Lembrem-se, decisão não é escolha que se resolve marcando X!). O que quero começar, agora, é uma nova cruzada. No NCPC conseguimos — lembrem-se que sofro de LEER  tirar o livre convencimento (emenda minha), introduzir a obrigação de decisão por coerência e integridade (artigo 926 por sugestão minha também) e o dever de fundamentação detalhada, como os leitores sabem muito bem, bastando, para tanto, ver as edições anteriores da ConJur para tomar conhecimento da luta que tivemos (este escriba, Dierle, Fredie, Alexandre Camara, Alexandre Morais da Rosa, André Karam, Georges Abboud, Eduardo Arruda Alvim, Rafael Tomas de Oliveira, entre outros).
Agora será a vez do Código de Processo Penal. Não me parece razoável que o novo CPP que está sendo gestado no Congresso preveja o poder de livre apreciação da prova. Eis a luta. Também do CPP teremos que expungir essa anomalia a-paradigmática. E teremos que colocar no CPP o dever de fundamentação, com a obrigação de, além de coerência e integridade, o juiz enfrentar todas as teses levantadas pelas partes. Já pensaram se aplicássemos a obrigação de coerência e integridade para o caso do juiz em liça?
Isso tudo para evitar que decisões como a do referido magistrado se repitam. Sabemos que hoje todos os tribunais dos Estados da nossa federação condenam acusados de furto, estelionato e trafico de entorpecentes lançando mão da inversão do ônus da prova. Isso jamais aconteceria se tivéssemos um CPP similar ao NCPC.
Na verdade, faço uma penitência: não precisaríamos colocar nada disso nos códigos se cumpríssemos a Constituição. O dever de fundamentação na Europa é um direito inalienável. É um direito humano fundamental. Aqui virou mercadoria de quiz show. Aqui virou caricatura. Sim, porque inverter o ônus da prova é retroceder séculos no direito. É retornar às ordálias. Você é culpado até provar o contrário. Ou seja, pegue este ferro quente na mão. Se não lhe queimar, é inocente. Bingo. Binguíssimo.
A etapa II da guerra contra o solipsismo! O novo CPP!
Por tudo isso, inicio hoje a etapa II da guerra contra o solipsismo em Pindorama. No início, minha luta era olhada de soslaio. Ah, lá vem o Lenio Streck falando contra o solipsismo. Que palavra seria essa? Alguns riam. Pois é: a palavra solipsista vem do alemão Selbsüchtiger, que quer dizer “viciado em si mesmo”. Sim, a realidade para o sujeito solipsista existe só a partir do ele, viciado em si, pensa.  Eis o dilema do jurista contemporâneo. No século XIX, no positivismo clássico, o jurista era viciado na lei (a lei era tudo; previa todas as hipóteses de aplicação). Era o século da razão, em que o direito pretendeu aprisionar a complexidade social em leis (França), conceitos (Alemanha) e precedentes (Inglaterra). Bingo. Saltamos para o século da vontade. Só que nunca conseguimos controlar essa vontade. E viramos viciados em nós mesmos. De um vício passamos a outro. Quase pior. É como saltar do personagem Angelo I para o Angelo II, da peça Medida por Medida, de Shakespeare.  Solipsismo é algo como crack gnosiológico. Basta experimentar uma vez e não larga mais. Eis o que aconteceu no direito.

Daí a nossa luta. Daí a minha cruzada. As inscrições estão abertas para cerrarmos fileiras nessa batalha. Se antes se olhava de soslaio minha luta, agora já começam a murmurar pelos quatro cantos. Oiço cousas como “poxa: de fato o NCPC tirou fora a palavra livre na questão do convencimento”. “— Então se o legislador tirou...é porque de fato quis”! E eu acrescento: É porque entendeu que, de fato, como defendo há muito tempo, o livre convencimento não se dá bem com a nossa Constituição. E a obrigação de coerência e integridade complementa essa alteração paradigmática.
Vai depender de nós. Da doutrina. Que, insisto mais uma vez, está na hora de voltar a doutrinar. Parar de ficar caudatária de decisões tribunalícias. A doutrina deve constranger os tribunais a decidir corretamente, e não o contrário, ou seja, doutrinar com base nas decisões proferidas. Temos de implementar o NCPC. E lutar para alterar o projeto do CPP. Sim. Lá está. Eu vi. Em pleno século XXI, até agora o legislador está mantendo o poder de livre apreciação da prova. E, o pior: com advogados participando da Comissão de redação do NCPP. Será que eles não sabem o que é sentir na carne o poder da livre apreciação? Hein? Será que eles imaginam uma sentença como a comentada nesta coluna? Cartas para a coluna.

 é jurista, professor, doutor e pós-Doutor em Direito. Assine o Facebook.


Revista Consultor Jurídico, 26 de março de 2015, 8h00

Ministros e advogados apontam inconsistências em propostas do MPF

PACOTE ANTICORRUPÇÃO

Ministros e advogados apontam inconsistências em propostas do MPF




O pacote anticorrupção anunciado pelo Ministério Público Federal na sexta-feira (20/3) não caiu bem. Segundo o MPF, o objetivo das dez medidas anunciadas — que serão entregues em anteprojetos de lei ao Congresso — é aprimorar a prevenção e o combate à corrupção e à impunidade. No entanto, para ministros do Supremo Tribunal Federal, advogados e até membros do Ministério Público ouvidos pela revista Consultor Jurídico, algumas propostas são inócuas, além de inconstitucionais.
Reprodução
O ponto que mais chamou  atenção é a pretensão de utilizar uma “prova” ilícita no processo penal. “Para dizer o mínimo, a proposta é lastimosa”, classifica o advogado, professor e diretor da Revista Brasileira de Direito Processual Lúcio Delfino(foto). “A aprovação dessa proposta significa a abertura de uma janela para a prática incontrolável de arbitrariedades, em benefício exclusivo do Estado policialesco. Melhor mudar o nome da proposta formulada pelo MPF para ‘pacote anti-devido-processo-legal”, diz. Delfino lembra que a proibição do uso de provas ilícitas é uma cláusula pétrea da Constituição. “Não é mera formalidade, como advogam alguns, mas garantia material assegurada constitucionalmente a todo e qualquer cidadão”, completa.
A questão, inclusive, já foi discutida pelo Supremo Tribunal Federal, como lembram os ministros Marco Aurélio e Gilmar Mendes. "Precisamos nos perguntar o que eles esqueceram na hora de formular essa proposta. E a resposta é clara: a Constituição", diz Mendes. Já Marco Aurélio aponta que a sugestão de aceitar provas ilícitas é "acreditar em uma Justiça na qual os fins justificariam os meios".
Ao justificar a proposta, o Ministério Público Federal alega que as provas obtidas por meios ilícitos não podem automaticamente prejudicar todo o processo. “É preciso fazer uma ponderação de interesses e verificar em que medida a eventual irregularidade na produção da prova pode indicar prejuízo à parte. Se não houver algo que evidencie prejuízo à defesa, nada justifica a exclusão dessa prova”, afirmou o subprocurador-geral da República Nicolao Dino Neto, chefe da Câmara de Combate à Corrupção.
No entanto, a justificativa não é o bastante nem mesmo para membros do Ministério Público. Roberto Livianu (foto), promotor de Justiça e doutor em Direito, lembra que a missão constitucional do MP é garantir a aplicação da Constituição. "É preciso trabalhar com provas 100% lícitas, também porque o uso de qualquer meio de prova questionável gerará um campo de ataque ao MP, o que não é desejável."

Lenio Streck, professor e advogado, recentemente aposentado do Ministério Público, afirma que a relativização do uso da prova ilícita contamina o conjunto de sugestões enviados pelo MPF. “Isso pegou muito mal. Ainda há juízes em Berlim e penso que ainda há promotores em terrae brasilis que estão preocupados com a cláusula pétrea que a proibição de uso de prova ilícita. Qual é o problema fulcral? A próxima vitima pode ser você. Hoje é bom relativizar a prova para pegar corruptos, lavadores de dinheiro. Amanhã isso será usado para qualquer coisa. Não se transige com garantias fundamentais. Ou eles valem ou não valem”, diz.
O criminalista Pierpaolo Cruz Bottini, ex-secretário da Reforma do Judiciário, corrobora o pensamento de Streck: “Não pode essa questão de fazer uma medição de viabilidade da prova pelos benefícios processuais e não pela pela lei. Isso é muito perigoso e não dá certo em nenhum lugar do mundo. Ou é legal ou não é”. Para Bottini, é muito perigoso admitir que o Estado pratique certas ilegalidades. “A justificativa de você poder admitir provas ilegais quando não causam prejuízo à defesa não está correto, a prova ilegal traz prejuìzo a sociedade, ao Estado Democrático de Direito".
O advogado José Carlos Cal Garcia Filho aponta que a Constituição e o Código de Processo Penal têm regras muito claras quanto à exclusão da prova ilícita, as quais não comportam ponderação ou flexibilização. “A proposta evidencia claro utilitarismo ou pragmatismo jurídico. Contraditoriamente, partindo da premissa da ilicitude das provas, o MP quer combater a impunidade de infrações penais com a declarada impunidade de violações a regras constitucionais e legais”, diz. “Certamente, o MP não faria esse tipo de proposta se tivesse mais cuidado com o controle das investigações. O número de processos anulados nos tribunais superiores é consequência da ausência de custódia da legalidade na produção da prova”, critica.
Prisão preventiva
Um outro item proposto pelo Ministério Público  Federal prevê a prisão preventiva para assegurar a devolução do dinheiro desviado. Para o criminalista Marcelo Leonardo a medida é um contra-senso. “É absurdo propor no país cuja constituição proíbe a prisão por dívida, uma proposta de prisão preventiva a obrigar pessoas a supostamente devolver dinheiro”, afirma. Para ele, o que o MPF propõe é o que ele já está fazendo na operação “lava jato”, na qual o advogado defende o vice-presidente da empreiteira Mendes Junior, Sérgio Cunha Mendes, que está preso preventivamente.

Reprodução
Pierpaolo Bottini (foto) observa que, pela lei atual, nos casos em que há indícios concretos de que está havendo dilapidação de patrimônio o juiz já pode decretar prisão preventiva. “O que querem na verdade fazer é uma presunção de que se você não encontrar os valores supostamente desviados, justificaria a prisão preventiva. Isso fere profundamente qualquer parâmetro de presunção de inocência”, afirma.
Na opinião de Lúcio Delfino, a proposta da prisão preventiva fere a Constituição. “Se ninguém pode ser considerado culpado até o trânsito em julgado, como reza nossa Constituição Federal, como admitir a validade de prisões com fins de evitar dissipação do dinheiro desviado?”, questiona. Para ele, não há devido processo quando o acusado é tratado como se culpado fosse.
Já Roberto Livianu defende a proposta do MPF. Ele aponta que a prisão preventiva é processual e não viola a presunção da inocência. "Todos, inclusive assassinos, têm a inocência presumida até que se encerre o processo. No entanto, se podem impedir o bom andamento do processo ou geram risco à ordem pública, há o instrumento da prisão preventiva".
No entanto, o advogado e professor Cal Garcia Filho afirma que o MP e o Judiciário já dispõem instrumentos altamente eficazes para prevenir a dissipação do patrimônio do suspeito ou, ainda, recuperar o produto da infração, tais como as medidas cautelares patrimoniais e os acordos de cooperação jurídica internacional. “Utilizar da prisão preventiva para essa finalidade soa como verdadeira extorsão legalizada: coação sobre a corpo do indivíduo a fim de que ele devolva o dinheiro ou ofereça os meios para que se proceda à recuperação”, diz.
Mudanças no sistema recursal
No documento apresentado pelo MPF, o órgão defende ainda mudanças nos recursos dos processos penais. Uma das sugestões é acabar com os Embargos Infringentes, que permitem a rediscussão de decisões colegiadas quando não há consenso entre os julgadores. Na Ação Penal 470, o processo do mensalão, esse recurso permitiu que o Supremo Tribunal Federal recuasse de condenações por formação de quadrilha e lavagem de dinheiro, por exemplo.

Outras medidas são a aplicação imediata de condenações quando for reconhecido abuso no direito de recorrer; o fim dos Embargos de Declaração de Embargos de Declaração; e a criação de um recurso em que o Ministério Público poderia discutir Habeas Corpus dentro do próprio tribunal que concede a ordem, para “uma paridade de armas” quando discordar da liberdade.
A paridade de armas alegadas pelo MPF para justificar as medidas é justamente o argumento utilizado pelos advogados para criticá-las.  Segundo o advogado Cal Garcia Filho, a reforma do sistema processual precisa ser sistemática, sem alterar a relação de freios e contrapesos, o necessário equilíbrio de armas entre as partes processuais. “O MP visa, apenas e tão só, diminuir os instrumentos e recursos disponíveis à defesa sem oferecer nada que possa reequilibrar a balança” afirma, apontando que a acusação dispõe de numerosos e diversos instrumentos para o exercício da sua função e seu papel de parte.
No mesmo sentido Lenio Streck (foto) afirma: “tudo o que é ad hoc pode ser perigoso. Até as pedras sabem que precisamos alterar o sistema recursal. Mas ele não deve mudar apenas para facilitar a vida do Estado e dos organismos encarregados de combate ao crime”. O jurista observa que os recursos são garantias do cidadão, e não o contrário. Em sua opinião, os embargos infringentes em favor do MP até podem ser uma boa medida, desde que acompanhada de uma série de outras medidas. “Não se pode restringir Habeas Corpus e recursos extraordinários. Habeas Corpus é um remédio constitucional. Não vamos inventar a pólvora agora voltando aos tempos do Estado de Exceção. Falta só dizerem que para alguns crimes não caberá Habeas Corpus”, diz.

Para o advogado Fábio Medina Osório, que também já foi membro do Ministério Público, a ideia de fulminar a previsão dos Embargos Infringentes não é boa, “pois trata-se de recurso que dá plenitude aos direitos de defesa. Não se pode restringir recursos contra condenações, pois o crivo do Judiciário deve ser o mais amplo possível”, diz.
Além das críticas às mudanças no sistema recursal, o criminalista Marcelo Leonardo questiona a proposta de ajustar o sistema prescricional para evitar impunidade nos casos em que não há inércia da partes. “Quer se premiar a ineficiência do sistema penal do Estado com a ampliação dos prazos de prescrição para que nem a policia, nem o MP e nem o Judiciário se preocupem em cumprir prazos para encerrar o processo”, diz.
Já aos olhos do promotor Roberto Livianu, as mudanças propostas são salutares. O sistema brasileiro, diz ele, permite a "eternização do processo". "Penso que medidas que visem alcançar celeridade do processo são importantes e íteis. Embargos Infringentes, por exemplo, não são essenciais para as garantias da ampla defesa. Pode-se abrir mão disso em prol de uma Justiça mais célere", afirma.
Outras medidas
Umas das propostas do MPF é aumentar a pena para os casos de corrupção e tornar a corrupção de altos valores crime hediondo. Para Marcelo Leonardo, essa sugestão é uma tentativa do parquet de desenterrar velhas propostas que em nada contribuem para a redução do ato. “Se transformar tipo penal em crime hediondo fosse eficiente desde a edição da Lei de Crimes Hediondos, em 1990, deveríamos ter estatísticas apontando a queda naquelas condutas ali tipificadas e não existe nenhuma estatística dessa redução”, diz. Segundo ele, elevar penas também nunca foi forma de reduzir criminalidade. “Nesse sentido se tem até a experiência de estados americanos que preveem a pena de morte enquanto outros não, e não há nenhuma estatística comprovando que onde há pena capital tenha redução criminalidade”, afirma.

Para o advogado Fábio Medina Osório, o que pode fortalecer mecanismos de combate e prevenção à corrupção aparentemente não foi abordado no pacote do MPF. Como exemplo ele cita transformar os contratos administrativos em contratos digitais. “Tal providência ensejaria maior transparência no setor público e poderia reduzir níveis de corrupção e de ineficiência”, diz.
A ideia de que faltam novas leis também é rebatida pelo ministro Marco Aurélio (foto), que resume seu pensamento sobre os "pacotes anticorrupção" feitos pelo MPF e pelo governo federal: "Já temos um entulho legislativo. Não precisamos de leis, mas de de um banho de ética. Todo mundo tem agora um milagre para chegarmos a novos dias. No campo formal, o Brasil está cheio. Quero saber da realidade".

 é repórter da revista Consultor Jurídico.


Revista Consultor Jurídico, 24 de março de 2015, 5h30

Banco não pode cobrar taxa de devolução de cheque sem fundos

COBRANÇA ILEGAL

Banco não pode cobrar taxa de devolução de cheque sem fundos





A cobrança de tarifa por devolução de cheque é ilegal e não pode ser justificada a pretexto de "descumprimento contratual". Por essa razão, a 3ª Vara Federal do Rio de Janeiro condenou o Itaú-Unibanco a restituir em dobro os consumidores pelos valores que foram obrigados a pagar. A tarifa foi cobrada de correntistas do banco que tiveram cheques devolvidos por falta de fundos no período de 30 de abril de 2008 a 21 de maio de 2009. A decisão vale para todo o Brasil.
A decisão foi proferida em uma Ação Civil Pública movida pela Procuradoria Regional da República no RJ. O órgão  identificou que o banco descumpriu uma norma do Conselho Monetário Nacional que veda às instituições financeiras de cobrar  tarifa nos casos de devolução de cheques. O Itaú, porém, cobrou a tarifa sob a alegação de que se tratava de multa por descumprimento contratual.
Ainda segundo a ação movida pela procuradoria da República, os valores foram cobrados ilegalmente devem ser devolvidos em dobro, conforme estabelece o Código de Defesa do Consumidor, com a devida correção monetária, assim como com os juros compensatórios de 0,5% ao mês desde a data de cada pagamento indevido, acrescidos de juros moratórios de 1% ao mês a partir de agosto de 2011.
Segundo a sentença, o Itaú-Unibanco deve ainda pagar indenização por dano moral coletivo no valor de R$ 20 milhões devido à cobrança ilegal da tarifa, que rendeu ao banco mais de R$ 64 milhões. Na avaliação da Justiça Federal, a instituição financeira teria agido de má-fé ao “tentar, de forma simulada, cobrar as tarifas bancárias em forma de 'multa contratual', agravada pelo fato de reconhecer, em seu sítio na internet, que tais valores seriam tarifa, para 'remunerar o banco pelos procedimentos operacionais'”. Com informações da assessoria de imprensa do MPF-RJ.
Processo 0008874-19.2011.4.02.5101

Revista Consultor Jurídico, 25 de março de 2015, 18h18