"Eu não recearia muito as más leis, se elas fossem aplicadas por bons juízes. Não há texto de lei que não deixe campo à interpretação.

A lei é morta. O magistrado vivo. É uma grande vantagem que ele tem sobre ela" - Anatole France

quarta-feira, 8 de abril de 2015

Desconhecer gravidez não retira estabilidade de trabalhadora temporária

SÚMULA DO TST

Desconhecer gravidez não retira estabilidade de trabalhadora temporária





O fato de o empregador desconhecer a gravidez da trabalhadora contratada por tempo determinado não retira da empregada o seu direito à estabilidade. O entendimento, pacificado na Súmula 244 do Tribunal Superior do Trabalho, foi aplicado pelo juiz Carlos Augusto de Lima Nobre, em exercício na 20ª Vara do Trabalho de Brasília, ao reconhece o direito à estabilidade de uma vendedora gestante dispensada do trabalho ao final do contrato de experiência. A empresa ainda foi condenada a pagar indenização por danos morais, no valor de R$ 5 mil, por discriminação.
Na reclamação, a trabalhadora alegou ter sido dispensada ao final do contrato experimental, sem observância da estabilidade provisória a que teria direito em face de sua gravidez. Já a empresa alegou, em defesa, que celebrou contrato de experiência com a vendedora, e que não tinha conhecimento da gravidez.
Ao analisar o caso, o juiz apontou que a questão jurídica atinente ao direito à estabilidade gestante, mesmo em se tratando de contrato por tempo determinado, gênero de contrato do qual o contrato de experiência é espécie, já se encontra pacificada no âmbito do Tribunal Superior do Trabalho na Súmula 244. O juiz também desconsiderou a argumentação da empresa de que não sabia da gravidez. O juiz explica que essa questão também está previsa na Súmula do TST que diz: “O desconhecimento do estado gravídico pelo empregador não afasta o direito ao pagamento da indenização decorrente da estabilidade”
Danos morais
O juiz condenou a empresa, ainda, ao pagamento de indenização por danos morais à vendedora. De acordo com a sentença, uma testemunha afirmou em juízo que após informar ao gerente que estava grávida, a empregada, que antes era elogiada como uma das que mais vendia na loja, passou a ser vítima de discriminação, não sendo mais cumprimentada pelo gerente. O superior passou a fazer comentários jocosos, referindo-se a ela como “a buchudinha da vez” e afirmando que “grávida entrega muito atestado, faz corpo mole”.

“O dano moral é manifesto, atingindo diretamente a auto-imagem da mulher, tão sensível nesse momento da vida quando seu corpo sofre com tantas alterações para acomodar nova vida ainda a caminho, e fere também a imagem profissional, antes elogiada, passa a ser considerada ‘corpo mole’”, registrou o juiz na sentença. O valor da indenização por danos morais foi fixado em R$ 5 mil. Com informações da Assessoria de Imprensa do TRT-10.
Processo 0001254-56.2014.5.10.020
Revista Consultor Jurídico, 6 de abril de 2015, 12h51

COMENTÁRIOS DE LEITORES

4 comentários

UM PRÊMIO À VAGABUNDAGEM

Tiago RSF (Serventuário)

A forma atual da súmula 244 do TST e a jurisprudência dela derivada é um prêmio à vagabundagem, um desserviço à sociedade.

Como mencionado pelo colega acerca de contratos por PRAZO DETERMINADO, a estabilidade alcança também àquelas que engravidam após receberem o AVISO PRÉVIO. E pior, estende-se também ao aviso prévio indenizado.

Grandes empresas não sentem o impacto dessas questões, mas pequenas empresas, empregadores individuais ou até mesmo empregadores domésticos são os que mais sofrem com essas disparidades legais.

O teste de sangue (Beta HCG) tem uma limitação técnica de falso-negativo, posto que seus resultados só são confiáveis a partir de 10 dias após a concepção. Assim, se eu demitir minha babá, independentemente de aviso-prévio trabalhado e indenizado, e ela resolver unir a ocasião e conseguir engravidar durante o aviso, além do absurdo de conceder estabilidade nestes caso, o teste de sangue não conseguirá pegar essa gravidez. Para PIORAR, a empregada, depois de demitida, pode RECUSAR a reintegração que ainda assim faz jus aos salários, mesmo da época em que não comunicou ao empregador.

Insanidade desse tipo só se vê na cabeça dos juízes, que têm salários altíssimos, que não vivem no mesmo mundo dos seres "normais" que suam para pagar as contas durante o mês e ainda têm de pagar uma funcionária.

Membro do MP não está imune à perda do cargo em caso de improbidade

PLANTÃO FORJADO

Membro do MP não está imune à perda do cargo em caso de improbidade





Lei Complementar 75/1993 e a Lei 8.625/1993 preveem a garantia da vitaliciedade aos membros do Ministério Público e a necessidade de ação judicial para aplicação da pena de demissão. Isso, no entanto, não induz à conclusão de que estes não podem perder o cargo em razão de sentença proferida na ação civil pública por ato de improbidade administrativa.
O entendimento, proferido pelo ministro Benedito Gonçalves, foi aplicado pela 1ª Turma do Superior Tribunal de Justiça ao reconhecer a possibilidade de, em ação civil pública por ato de improbidade administrativa, ser aplicada a pena de perda do cargo a membros do Ministério Público.
Em seu voto, o relator, ministro Benedito Gonçalves explicou que, além de a Constituição Federal assegurar que todos os agentes públicos estão sujeitos à perda do cargo em razão de atos ímprobos, a Lei de Improbidade Administrativa (Lei 8.429/1992) também deixa claro que não há exceções às sanções previstas.
Para o relator, a conclusão seria uma decorrência lógica do que está disposto no artigo 12 da Lei de Improbidade. Segundo o dispositivo, "independentemente das sanções penais, civis e administrativas previstas na legislação específica, está o responsável pelo ato de improbidade sujeito às seguintes cominações, que podem ser aplicadas isolada ou cumulativamente, de acordo com a gravidade do fato". A turma, por unanimidade, acompanhou o relator.
No caso, a ação foi movida contra dois promotores substitutos que, durante recesso forense, forjaram o plantão em que deveriam ter trabalhado juntos. O juiz de primeiro grau admitiu o processamento da ação por improbidade, mas decisão interlocutória ressalvou a impossibilidade de aplicação da pena de perda da função pública.
O magistrado entendeu que os casos de perda da função pública, para membros do MP e da magistratura, estão expressamente delineados pela Lei 8.625/1993 (Estatuto do MP) e pela Lei Complementar 35/79. A decisão foi contestada em agravo de instrumento, mas o Tribunal de Justiça de Minas Gerais manteve aquele entendimento. No STJ, o recurso do Ministério Público de Minas Gerais foi provido, e a 1ª Turma reconheceu que o membro do MP não está imune à perda do cargo em caso de improbidade.Com informações da Assessoria de Imprensa do STJ.
REsp 1.191.613

Revista Consultor Jurídico, 7 de abril de 2015, 15h53

sábado, 4 de abril de 2015

Resposta eficaz ao crime passa por um novo Código de Processo Penal

NORMAS PROCESSUAIS

Resposta eficaz ao crime passa por um novo Código de Processo Penal



Foi em razão de normas processuais justas que a vingança privada sucumbiu ao império da lei. A crença da humanidade em um sistema penal estatal não decorreu da dureza das penas, mas da justeza do processo. O devido processo legal (due process of law) foi o grande artífice dessa viragem, constituindo-se na verdadeira garantia de efetividade da lei penal.
De tempos em tempos somos tomados pelo arroubo da retórica da impunidade, do discurso da lei e ordem. E, parece trivial que não se obtém resultado diferente persistindo-se no mesmo tipo de ação. Diante de episódicos delitos dantescos seguem-se as mesmas proposições de enfrentamento: novas inserções no catálogo de crimes hediondos, agravamento de penas, endurecimento de medidas. Tudo para aplacar o clamor das ruas!
Assim se deu com o homicídio, o estupro e tráfico de vulnerável, a importação e adulteração de produto farmacêutico ou medicinal, dentre outros, severamente sancionados depois de cinematográficas exposições midiáticas de casos policiais que chocaram a opinião pública.
A despeito do recrudescimento da reprimenda penal, os índices ascendentes da criminalidade não foram profligados com tais medidas: 50 mil assassinatos anuais; no ranking das Nações Unidas estamos entre os que mais matam mulheres; aumento da prostituição infantil, difusão da pirataria e o comércio ilegal de drogas em níveis alarmantes.
Agora é a vez do crime de corrupção. Pretende-se torná-lo hediondo — como se já não o fosse! Começam a pipocar os famosos pacotes de combate, aos auspícios daqueles mesmos padrões de conduta, cujos resultados, certamente, não serão outros.
Viceja entre nós a falsa ideia de que a criminalidade deriva unicamente da impunidade, e esta da reduzida penalização criminal. Essa relação, fosse verdadeira, estaria resolvida com a técnica esfalfada e casuística da elevação de penas.
O foco deveria ser outro. Nossas normas processuais não primam pela melhor justiça. A começar, estão defasadas: datam de 1941, plasmadas no vetusto regime do Estado Novo de Getúlio Vargas. A despeito de pontuais reformas, a segurança jurídica, a paridade de armas e o efetivo contraditório ainda são princípios de pouca densidade pragmática no contexto jurídico processual que norteia a jurisdição penal.
Para piorar ainda mais o anacronismo do modelo, para além da mesmice, o pacote anticorrupção recentemente apresentado pelo Ministério Público Federal à nação brasileira traz a lume o lado sombrio da atuação de órgãos da persecução penal: pretende-se relativizar o princípio constitucional da proibição da prova ilícita, como forma de combater a corrupção (artigo 5º, inciso LVI, da CF, “são inadmissíveis, no processo, as provas obtidas por meios ilícitos”).
Alega-se que a anulação de processos por “meros erros formais” têm favorecido a impunidade. E, sabe-se que diversas operações de forte apelo midiático, de fato, acabaram anuladas pela Justiça por vícios insanáveis de nulidade.
É a crua realidade: em pleno século XXI e sob o manto programático constitucional do Estado Democrático de Direito e da dignidade da pessoa humana, nosso processo penal ainda é tisnado pelas denúncias anônimas, interceptações telefônicas ilegais, violações de domicílio, quebras ilegais de sigilo, dentre outras arbitrariedades estatais.
Tais ilicitudes de prova são as mais aparentes, não se podendo negar a existência de tantos outros métodos esquizofrênicos de protagonismo clandestino, patrocinados por agentes públicos pagos pelos titulares do direito pétreo por eles pisoteado.
Investigações secretas resistem ao tempo e aos órgãos de controle. Juízos e tribunais de exceção vão sendo instalados sem parcimônia, estando aí regras abertas de prevenção a garantir que expedientes mais antigos atraiam determinadas causas novas ao juiz “escolhido”. Outras vezes é o pensamento hermenêutico o único critério (velado) a guiar convocações para os tribunais de segunda instância, de modo que a figura fantasmagórica do juiz ad hoc ou do juiz ex post facto vem se fazendo presente neste cenário de instabilidade processual cada vez mais acentuada.
Portanto, é de reforma do processo penal que o Brasil precisa. Processos instaurados como meio de punição, mesmo diante de sua flagrante inutilidade, são uma realidade constante. O princípio da isonomia ainda não foi incorporado ao processo; note-se que para a soltura de preso se penaliza o pobre com a exigência de prova de ocupação lícita e de residência fixa.
O efetivo contraditório é uma falácia com o modelo processual atual, que ainda abarca a esdrúxula figura do recurso (remessa) de ofício. O sistema recursal permite uma infinidade de medidas que procrastinam o início do cumprimento da pena. Esta não precisa necessariamente ser longa. Deveria ser apenas efetiva e reparadora.
A eficácia da resposta estatal ao crime tem a ver muito mais com um bom modelo processual do que com as penas abstratamente cominadas. Com a morosidade, perdem legitimidade as instituições do Estado e meios de justiçamento se espraiam e ganham força. É possível investigar bem, produzir provas, com respeito à Constituição.
A dignidade da pessoa e o Estado de Direito são valores que se realizam de acordo com a boa aplicabilidade dos direitos humanos. O momento não é o de revogar a Constituição Federal, mas, sim, instituir-se uma nova legislação processual que garanta a realização dos valores nela insculpidos.

 é juiz federal em São Paulo, especialista em Direito Penal e professor de Direito Constitucional.

Revista Consultor Jurídico, 1 de abril de 2015, 7h33

COMENTÁRIOS DE LEITORES

16 comentários

ÓTIMO JUIZ.

João B. G. dos Santos (Advogado Autônomo - Criminal)
O doutor Ali é um juiz de perfil em extinção infelizmente pois além de culto faz o Direito valer de forma integral, muito diferente dos magistrados que não cumprem a lei do país e que hoje são a maioria.

VERDADE

Edson Vander da Assunção (Defensor Público Estadual)
Parabéns ao articulista pela clareza das colocações e pelo senso de realidade com que avaliou o nosso momento e o ordenamento jurídico brasileiro. Precisamos de mais operadores do direito comprometidos com essa verdade e prontos para lutar por uma legislação mais precisa, clara, constitucional e justa. Justa tanto para as "vítimas" quanto para os que preferem viver á margem, bem como para os ocasionais. Assim, com respeito, poderemos trabalhar para um país melhor, mais democrático, isonômico. Parabéns.

ENFIM O BOM SENSO

DR. CARLOS ALBERTO (Advogado Associado a Escritório)
Parabéns Magistrado, o Senhor é tipo de juiz que o país precisa. Não se constrói um estado de direito tripudiando ou fazendo promoção pessoal da desgraça alheia. Buscar notoriedade ao desgraçar vidas, ainda que de acusados, suprimindo e aviltando direitos, afigura-se um crime tão ou mais grave que o do próprio réu, mas falta sensibilidade para que a sociedade perceba a sutileza desse tipo de crime. Talvez os que clamam por sangue, morte e cadeia só entendam o que queremos dizer quando tiverem um filho, pai ou irmão subjugado num processo injusto! Mais uma vez Parabéns.