"Eu não recearia muito as más leis, se elas fossem aplicadas por bons juízes. Não há texto de lei que não deixe campo à interpretação.

A lei é morta. O magistrado vivo. É uma grande vantagem que ele tem sobre ela" - Anatole France

sexta-feira, 8 de maio de 2015

CJF rediscutirá norma que dá ao MPF o controle sobre inquéritos

TRAMITAÇÃO INTERNA

CJF rediscutirá norma que dá ao MPF o controle sobre inquéritos



O Conselho da Justiça Federal vai rediscutir a resolução que trata da tramitação de inquéritos diretamente entre Polícia Federal e Ministério Público Federal. A norma, aprovada em 2009 pelo CJF, dá ao MP Federal o poder de autorizar mais prazos para a PF concluir um inquérito, sem que a questão passe pelo Judiciário.
Depois da aprovação de uma emenda ao texto, por requisição da Ordem dos Advogados do Brasil foi criada uma comissão para estudar o tema. O grupo é formado pelo corregedor-geral da Justiça Federal, ministro Jorge Mussi; pelo ministro Luis Felipe Salomão, do Superior Tribunal de Justiça; pelo presidente do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, desembargador federal Fabio Prieto; por um representante da OAB e um da Associação dos Juízes Federal do Brasil (Ajufe).
Na última sessão ordinária do CJF, foi aprovada uma emenda a essa resolução para dizer que o próprio MP será o órgão responsável  por determinar que Procuradoria Regional da República será responsável pelas investigações quando houver dúvida sobre a competência.
Foi o ponto de partida para as disputas. Na prática, a resolução dá ao MP o poder de controlar o inquérito e, em última análise, as investigações. E o Código de Processo Penal diz que essa competência é do Judiciário. Se a resolução, por si só, já diminuía os poderes do juiz no inquérito, a emenda deu ao MP a prerrogativa de, indiretamente, decidir até o foro judicial em que os inquéritos tramitarão.
Para Kayatt, da OAB, controle deve sempre ser feito por autoridade judiciária.
Reprodução
A OAB também acusa que a resolução fere o direito de defesa. Segundo o advogado Marcio Kayatt, conselheiro federal OAB por São Paulo, essa regra impede que o advogado, e, consequentemente, o investigado, tenha acesso ao inquérito. “Se vou à PF, dizem que está com o procurador; se vou ao MP, dizem que está com o delegado. Nisso, o advogado é posto para pular de galho em galho, muitas vezes propositadamente. Por isso o controle deve ser sempre feito por uma autoridade judiciária.”
Kayatt também aponta que, nos processos criminais, o Ministério Público é sempre parte. E se couber ao órgão o controle do inquérito policial, “fica prejudica a paridade de armas”. “A magistratura também fica completamente desprestigiada, passa a ser mera espectadora”, afirma.
Diante da reclamação dos advogados e da magistratura, o presidente do CJF, ministro Francisco Falcão, antes favorável à ideia, decidiu retirar a matéria de discussão e não assiná-la antes que a comissão de estudo chegue a uma conclusão sobre o assunto. 

 é editor da revista Consultor Jurídico em Brasília.

Revista Consultor Jurídico, 7 de maio de 2015, 7h27

Defensoria Pública pode propor ação civil pública, decide Supremo

SEM BARREIRA

Defensoria Pública pode propor ação civil pública, decide Supremo


O Supremo Tribunal Federal decidiu nesta quinta-feira (7/5), de forma unânime, que a Defensoria Pública tem legitimidade de propor ação civil pública porque esta não é uma atribuição exclusiva do Ministério Público. A decisão foi tomada em Ação Direta de Inconstitucionalidade proposta pela Associação Nacional dos Membros do Ministério Público (Conamp) e seguiu o voto da relatora, ministra Cármen Lúcia.
A entidade questionava o inciso II do artigo 5º da Lei 7.347/1985, com redação dada pela Lei 11.448/07. Os textos definem como uma das competências da Defensoria a propositura de ações civis públicas. A Conamp sustentava que o dispositivo afeta os poderes Ministério Público.
Para os membros do MP, a Defensoria somente poderia atender aos necessitados que comprovarem carência financeira, portanto "aqueles que são atendidos pela Defensoria Pública devem ser, pelo menos, individualizáveis", sendo impossível à Defensoria atuar na defesa de interesses difusos, coletivos ou individuais homogêneos.
Segundo a ministra Cármen Lúcia, inexiste legislação que impeça a Defensoria de propor ações públicas e dê exclusividade, por outro lado, ao MP. No entendimento da ministra, não se pode negar a quem não tem condições financeiras a possibilidade de ser favorecido por meio de ações coletivas com o argumento de que só valem para interesses difusos.
Para ela, tendo em vista a desigualdade notória da sociedade brasileira, não se pode impor barreira ao acesso à Justiça, sendo o dever estatal atuar para reduzir a desigualdade e operacionalizar instrumentos que atendem a população menos favorecida. “Deve-se retirar obstáculos para que os pobres tenham acesso à Justiça como forma de diminuir desigualdades e reforçar a cidadania”, disse.
Em sua participação no julgamento, o ministro Luís Roberto Barroso destacou que as defensorias são um diferencial brasileiro de inclusão dos necessitados.  Para o ministro Marco Aurélio, não teria sentido existir um órgão que protegesse apenas individualmente quem mais precisa. 
ADI 3.943

 é repórter da revista Consultor Jurídico.

Revista Consultor Jurídico, 7 de maio de 2015, 16h54

Entidades de magistrados apontam inconstitucionalidade em PEC da Bengala

VÍCIO FORMAL

Entidades de magistrados apontam inconstitucionalidade em PEC da Bengala



Diversas associações de juízes criticaram a aprovação na terça-feira (5/5) da PEC da Bengala (PEC 457/2005) na Câmara dos Deputados. A medida que vai à promulgação, sem precisar de sanção presidencial, aumenta de 70 para 75 anos a idade para a aposentadoria compulsória de ministros de tribunais superiores e do Supremo Tribunal Federal. Agora, algumas delas vão além e alegam que a PEC é inconstitucional por ter vício de iniciativa.
O argumento é semelhante ao utilizado pela Associação Nacional dos Procuradores Federais em Ação Direta de Inconstitucionalidade movida no STF para contestar a criação de novos Tribunais Regionais Federais, estabelecida pela Emenda Constitucional 73/2013. Para a entidade, leis que alteram o funcionamento do Judiciário devem ser propostas ao Congresso pelo STF ou por tribunais superiores, conforme artigo 96, inciso II, alíneas “a” e “b”, da Constituição Federal.
O então presidente do Supremo, Joaquim Barbosa, notório opositor da medida, concedeu liminar suspendendo os novos TRFs. A ação ainda não julgada no mérito e a decisão perdura até hoje.
Da mesma forma, entidades representativas de juízes sustentam que, para ter validade, a PEC da Bengala deveria ter sido proposta pelo Judiciário, e não por um membro do Legislativo — no caso, o ex-senador Pedro Simon (PMDB-RS).
Na visão do presidente eleito da Associação Nacional dos Magistrados da Justiça do Trabalho (Anamatra), Germano Siqueira, a origem desse projeto pode ser um motivo para que a questão chegue ao STF e a corte analise sua validade.
“Há matérias que já foram levadas ao STF pela Anamatra, Associação dos Juízes Federais do Brasil (Ajufe) e Associação dos Magistrados Brasileiros (AMB) discutindo exatamente questões referentes a vício de iniciativa e à própria sede legislativa em que foram consolidadas algumas questões. No caso da elevação da idade para aposentadoria compulsória com reflexos no Judiciário, é uma questão que pode também passar por essa análise”, opina Siqueira.
O presidente da Associação Paulista de Magistrados (Apamagis), Jayme de Oliveira, também enxerga a possibilidade de contestar a alteração à CF por essa via. Embora o artigo 60 da Constituição não inclua órgãos do Judiciário na lista dos que podem apresentar PECs, muitos entendem que esses instrumentos não são função legislativa, mas constituinte, aponta o juiz. Sendo assim, tribunais teriam, sim, competência para propor alterações ao texto constitucional.   
Ao admitir essa prerrogativa do Judiciário, prevaleceria a disposição de que apenas órgãos desse poder podem regrar seu auto-funcionamento. Dessa forma, a PEC da Bengala poderia ser inconstitucional, explica Oliveira.
“O entendimento pela inconstitucionalidade por vício formal gera a possibilidade de ADI. Nesta, o STF pode declarar a inconstitucionalidade com efeito geral, anulando a emenda. Essa possibilidade, embora rara no Direito Comparado, é assente e corrente na jurisprudência do Supremo”, explica.
Outros caminhos
Mesmo discordando da hipótese, o presidente da Apamagis ressalva que aumentar a idade da aposentadoria compulsória pode ser considerado matéria previdenciária, e não norma de funcionamento interno. Portanto, algo fora da competência do Judiciário.

Segundo o presidente da Ajufe, Antônio César Bochenek, a elevação da idade-limite que um ministro do STF ou tribunal superior pode ficar na ativa só seria inconstitucional se tivesse sido feita por meio de legislação infraconstitucional: “Nesse caso, além de inconstitucional, se tivesse partido de iniciativa parlamentar, a lei ordinária seria também um atentado à [cláusula pétrea da] separação dos Poderes”.
Mas como a mudança foi feita por emenda constitucional, ela é legítima, afirma Bochenek. Além disso, ele tem a opinião de que o Judiciário não pode apresentar PECs, as quais são de competência apenas do presidente da República, de deputados federais, senadores, e das Assembleias Legislativas dos estados.
Essa interpretação é compartilhada pelo presidente da AMB, João Ricardo Costa. De acordo com o juiz, o Congresso pode legislar em qualquer matéria constitucional. Logo, o STF não poderia derrubar a PEC da Bengala por desconformidade com a Constituição.
Críticas
Embora divirjam quanto à constitucionalidade da Emenda da Bengala, as associações são unânimes em criticar a aposentadoria compulsória aos 75 anos. Para elas, isso tornará a carreira da magistratura menos atraente, uma vez que ficará mais difícil ser promovido. Como efeito, bons quadros vão se afastar da profissão e preferir ingressar no Ministério Público ou continuar na advocacia, alegam.

As entidades também defendem que a mudança pode engessar o desenvolvimento da jurisprudência, uma vez que magistrados permaneceriam por tempo excessivo nos tribunais.
As motivações por trás da aprovação da PEC da Bengala ainda são atacadas pelas representantes dos juízes, que dizem que a proposta só foi aprovada para impedir que a presidente Dilma Rousseff nomeasse mais dois ministros para o STF até o fim de seu mandato — o que deixaria a corte com apenas um membro não indicado pelo PT, Gilmar Mendes (escolhido por Fernando Henrique Cardoso).

 é repórter da revista Consultor Jurídico.

Revista Consultor Jurídico, 7 de maio de 2015, 19h52