"Eu não recearia muito as más leis, se elas fossem aplicadas por bons juízes. Não há texto de lei que não deixe campo à interpretação.

A lei é morta. O magistrado vivo. É uma grande vantagem que ele tem sobre ela" - Anatole France

quarta-feira, 27 de maio de 2015

Não cabe ao STJ decidir qual é o alcance das teses que define

ÓRGÃO DE CONSULTA

Não cabe ao STJ decidir qual é o alcance das teses que define

As decisões tomadas pelo Superior Tribunal de Justiça em recursos repetitivos têm como objetivo “traçar as linhas gerais acerca da tese aprovada”. Portanto, não cabe ao tribunal definir qual deve ser o alcance de seus julgados, já que “não é órgão de consulta”. Foi o que definiu a Corte Especial do STJ ao julgar Embargos de Declaração interpostos contra adecisão do colegiado sobre o uso da Tabela Price. A decisão é do dia 6 de maio.
O caso do uso da tabela foi uma das decisões mais aguardadas, e necessárias, da Corte Especial. A Tabela Price é uma forma de cálculo de juros que usa a fórmula de juros compostos. A discussão que estava posta ao STJ era se o uso desse método em contratos do Sistema Financeiro Habitacional caracterizava ou não capitalização de juros.
A decisão da Corte Especial foi a aplicação da Tabela Price é uma questão de fato, e não de direito. E como a jurisprudência do STJ proíbe a capitalização de juros em contatos do SFH, saber se a aplicação do Sistema Price resulta ou não em juros capitalizados exigiria análise de cláusulas contatuais e perícia contábil para avaliação de provas. Duas práticas vedadas ao STJ pelas súmulas 5 e 7, respectivamente.
Depois da decisão da Corte Especial, que seguiu o voto do ministro Luis Felipe Salomão, a parte vencedora interpôs Embargos de Declaração. Pediu para que o STJ explicasse em quais hipóteses a produção de prova pericial seria necessária. A argumentação é de que só precisaria ser feita perícia nos casos em que a lei proíbe a capitalização, pois, se há previsão legal, não faz diferença constatar por meio de perícia se há ou não incidência de juros sobre juros.
O pedido dos embargos era para que o tribunal suprisse "omissão, para explicitar que a prova pericial se revela útil (e necessária) apenas nas situações em que a ocorrência de capitalização de juros estaria vedada na relação contratual".
Aplicação da Tabela Price é questão de fato, não de direito, afirmou Salomão.
Sandra Fado/STJ
Pedido real
A decisão da Corte Especial nos embargos também foi unânime. De acordo com o voto do relator, ministro Salomão, o que a embargante pretendia era “dar alcance por demais elastecido” à tese definida no recurso que tratou da Tabela Price nos contratos do SFH.

Salomão explicou em seu voto que a decisão da Corte Especial fora a de que nos casos em que não é permitida a capitalização, é necessária a produção de provas para saber se o uso da Tabela Price para cálculo de juros é legal ou não. “Mas daí a se afirmar que apenas nos contratos com esses contornos faz-se necessária a prova pericial vai um abismo.”
O ministro aproveitou o pedido para ensinar os limites dos recursos repetitivos: “Especificamente em julgamentos representativos de controvérsia (CPC, artigo 543-C), cabe ao STJ traçar as linhas gerais acerca da tese aprovada, descabendo a inserção de soluções episódicas ou exceções que porventura possam surgir em outros indetermináveis casos, sob pena de se ter de redigir verdadeiros tratados sobre todos os temas conexos ao objeto do recurso”.
EDcl no REsp 1.124.552
Clique aqui para ler o acórdão

Ameaçado de despejo, MP-SP não pode se defender por conta própria

PARTICIPAÇÃO COM LIMITES

Ameaçado de despejo, MP-SP não 
pode se defender por conta própria

É a Fazenda estadual quem deve atuar como parte em processo que cobra valores atrasados de aluguel do Ministério Público, pois o órgão não tem personalidade jurídica para agir nesse tipo de assunto. Assim entendeu a 25ª Câmara de Direito Privado do Tribunal de Justiça de São Paulo ao rejeitar pedido apresentado pelo procurador-geral de Justiça, Márcio Elias Rosa.
Duas empresas do ramo imobiliário alegam ser proprietárias do imóvel que sedia as Procuradorias de Justiça da capital paulista, na rua Manoel da Nóbrega, e afirmam que o valor devido ultrapassou R$ 1,5 milhão em 2013 (a mensalidade era de R$ 136,5 mil). A cobrança na Justiça tramita desde aquele ano, mas o procurador-geral alegava que todo o processo deveria ser considerado nulo, pois o MP-SP não foi citado para se defender.
Como qualquer resultado desfavorável vai impactar seus procuradores de Justiça, a instituição apontava o risco de sofrer prejuízo em sua autonomia. Já o desembargador Marcondes D’Angelo, relator do caso, concluiu que “a Fazenda do Estado de São Paulo [é] a única legitimada para figurar no polo passivo da lide”, ficando o Ministério Público somente na posição de órgão público, sem personalidade jurídica.
O relator afirmou que o MP só pode agir como parte “quando expressamente autorizado por lei, o que não é a hipótese dos autos”, “haja vista que não pode suportar diretamente os efeitos de eventual sentença de procedência do pedido de natureza patrimonial”. Apesar disso, o desembargador reconheceu a instituição como assistente simples de forma subordinada à Fazenda, tendo o direito inclusive de produzir provas.
O MP-SP não planeja recorrer dessa decisão e afirma que o prédio foi desapropriado em 1994, com a quitação de todos os valores devidos. O processo está suspenso até que a Fazenda avalie a controvérsia.
Clique aqui para ler o acórdão.
Processo: 2016851-61.2015.8.26.0000
 é repórter da revista Consultor Jurídico.

Revista Consultor Jurídico, 26 de maio de 2015, 16h12

terça-feira, 26 de maio de 2015

STJ uniformiza entendimento sobre herança em comunhão parcial de bens

SUCESSÃO EM DEBATE

STJ uniformiza entendimento sobre herança em comunhão parcial de bens

O cônjuge sobrevivente, casado sob o regime da comunhão parcial de bens, concorre com os descendentes na herança do morto apenas em relação aos bens particulares deixados. Com esse entendimento, a 2ª Seção do Superior Tribunal de Justiça analisou recurso que discutiu a interpretação da parte final do inciso I do artigo 1.829 do Código Civil.
A decisão confirma o Enunciado 270 da III Jornada de Direito Civil, organizada pelo Conselho da Justiça Federal, e pacifica o entendimento entre a 3ª e a 4ª Turma, que julgam matéria dessa natureza.
O enunciado afirma que “o artigo 1.829, I, do CC/02 só assegura ao cônjuge sobrevivente o direito de concorrência com os descendentes do autor da herança quando casados no regime da separação convencional de bens ou, se casados nos regimes da comunhão parcial ou participação final nos aquestos, o falecido possuísse bens particulares, hipóteses em que a concorrência se restringe a tais bens, devendo os bens comuns (meação) serem partilhados exclusivamente entre os descendentes".
Segundo o ministro Raul Araújo, responsável por lavrar o acórdão, o Código Civil modificou a ordem de vocação hereditária, incluindo o cônjuge como herdeiro necessário, passando a concorrer em igualdade de condições com os descendentes do falecido. Embora haja essa prerrogativa, a melhor interpretação da parte final desse artigo sobre o regime de comunhão parcial de bens, segundo o ministro,  não pode resultar em situação de descompasso com a que teria o mesmo cônjuge sobrevivente na ausência de bens particulares do morto.
Disputa por terreno
No caso analisado, o autor da ação iniciou relacionamento de união estável em 1981. Em 1988, casou sob o regime de comunhão parcial de bens, quando a mulher já era proprietária de um terreno. Ao longo de 12 anos após o casamento, foi construído no terreno um prédio residencial, com recursos do autor, no montante de R$ 78,6 mil. A mulher morreu em 2008, e o viúvo ajuizou ação para ser reconhecido como proprietário do imóvel, total ou parcialmente.

Os filhos da mulher sustentaram que o imóvel não se comunicava com o cônjuge, pois se trata de bem adquirido anteriormente ao casamento. O Tribunal de Justiça de São Paulo concordou com a tese defendida pelos filhos, mas a 2ª Seção do STJ deu provimento ao recurso do viúvo, que tem mais de 80 anos, reconhecendo o seu direito à meação e à participação como herdeiro necessário dos bens particulares.
Controvérsia
O artigo 1.829, I, do Código Civil dispõe que a sucessão legítima defere-se em uma ordem na qual os descendentes concorrem com o cônjuge sobrevivente, salvo se casado com o morto no regime da comunhão universal, ou no da separação obrigatória de bens (artigo 1.640, parágrafo único), ou se, no regime da comunhão parcial, o autor da herança não houver deixado bens particulares.

A questão que gerou divergência entre os ministros foi a interpretação da parte final desse artigo, na identificação dos bens em relação aos quais o cônjuge sobrevivente, na qualidade de herdeiro necessário, concorrerá com os descendentes, quando adotado o regime de comunhão parcial de bens.
A controvérsia era saber se a concorrência incidiria sobre todo o conjunto dos bens deixados pelo falecido, chamado de herança; apenas sobre os adquiridos onerosamente na constância do casamento, excluída a meação do cônjuge sobrevivente, a exemplo do que ocorre na sucessão do companheiro (artigo 1.790); ou apenas sobre os bens adquiridos antes do casamento, os quais a lei chama de particulares.
Bens particulares
O relator original do recurso no STJ, ministro Sidnei Beneti (hoje aposentado), apresentou a tese que saiu vencedora na 2ª Seção. Ele entendeu que a concorrência somente se dá em relação a bens particulares, ou seja, em relação àqueles que já integravam o patrimônio exclusivo do cônjuge ao tempo do casamento.

A ministra Nancy Andrighi divergiu desse entendimento. Para ela, o cônjuge sobrevivente, segundo seu direito à meação, concorreria na herança apenas quanto aos bens comuns, havendo ou não bens particulares, que deveriam ser partilhados unicamente entre os descendentes.
 Com informações da Assessoria de Imprensa do STJ.
Revista Consultor Jurídico, 26 de maio de 2015, 20h23