"Eu não recearia muito as más leis, se elas fossem aplicadas por bons juízes. Não há texto de lei que não deixe campo à interpretação.

A lei é morta. O magistrado vivo. É uma grande vantagem que ele tem sobre ela" - Anatole France

terça-feira, 24 de novembro de 2015

Justiça de Minas proíbe MP de acessar sistema interno da Polícia Civil


CONTROLE EXTERNO

Justiça de Minas proíbe MP de acessar 
sistema interno da Polícia Civil

O controle externo exercido pelo Ministério Público sob a polícia não abarca toda e qualquer atividade desenvolvida pela instituição. Foi o que decidiu a juíza Juliana Faleiro de Lacerda Ventura, da 2ª Vara Cível de Araguari, em Minas Gerais, ao julgar improcedente uma ação civil pública movida peloparquet para garantir acesso aos registros internos da Polícia Civil mineira.
No pedido, o MP-MG requereu senha para acesso direto ao sistema interno da Polícia Civil de gerenciamento de procedimento policias pela web, para acompanhar os registros de ocorrência, de inquéritos policias, de fiança criminal e de diligências preliminares, entre outros procedimentos. Pediu ainda que o estado seja obrigado a divulgar na internet os Registros de Eventos de Defesa Social (REDs) que geram inquéritos policias, assim como o número de pessoas presas e vagas existentes por unidade prisional.
O MP argumentou que a Promotoria responsável pelo controle externo da atividade policial tem tido dificuldade para acompanhar as notícias-crime oriundas das ocorrências registradas na delegacia de Araguari. Destacou que nem todas resultam em inquéritos e que, em razão da falta de informações, o órgão tem sido procurado por cidadãos interessados em saber as providencias tomadas nas suas demandas.
Segundo o MP-MG, a negativa da polícia em lhe dar acesso ao sistema impede o controle externo da atividade policial e dificulta o efetivo controle da criminalidade, já que muitos registros deixam de ser encaminhados aoparquet ou ao Judiciário.
Já a Polícia Civil argumentou que o controle externo que a Constituição Federal conferiu ao Ministério Público não pode ser negado, mas encontra limites normativos, uma vez que nem toda atividade está sujeita ao domínio do MP por estar alicerçada na autonomia administrativo-funcional, também concedida por lei à autoridade policial. Para a polícia, o controle externo do MP não lhe dá poder disciplinar nem o autoriza a conduzir investigações ou procedimentos policias, assim como fiscalizar e gerenciar atos de natureza administrativa interna.
Ao analisar o caso, a juíza deu razão à Polícia Civil. De acordo com ela, o controle externo do MP sob a atividade policial tem como fundamento a defesa da ordem jurídica e do regime democrático a fim de salvaguardar a sociedade de quaisquer medidas que possam resultar em violação dos direitos constitucionais sociais e individuais indisponíveis.
“Todavia, esta atribuição dada ao parquet deve ser analisada com parcimônia, dada sua incidência limitada a certos atos perpetrados pela polícia. O controle externo não incide sobre toda e qualquer atividade policial, mas apenas se verifica em relação aos atos que digam respeito à chamada ‘polícia judiciária’ e à apuração de infrações penais, quando exercidas pela Polícia Civil”, destacou.
Para a juíza, o controle externo exercido pelo MP não implica em subordinação por parte dos membros da Polícia Civil. “Por certo, não é intuito do legislador criar verdadeira hierarquia ou disciplina administrativa, subordinando a autoridade policial e seus funcionários aos agentes do Ministério Público”, destacou.
Na avaliação da juíza, as regras para o controle externo pelos ministérios públicos dos estados constam na Lei Orgânica do MP da União, que nessa questão é aplicado de forma subsidiária. A norma estabelece as medidas à disposição do Ministério Público para exercer essa atribuição.
“Há disposição legal que dispõe acerca do acesso a estabelecimentos e documentos, possibilidade que o promotor fiscalize a legalidade da atuação policial e exerça um limitado controle formal do inquérito. Contudo, continua faltando um dispositivo que diga de forma clara que o Ministério Público exercerá o controle externo da atividade policial, dando instruções gerais e específicas para a melhor condução do inquérito policial, as quais estarão vinculados os agentes da polícia judiciária. E, diante da ausência de regulamentação no sentido de se permitir o acesso do Ministério Público aos dados existentes nos sistemas da Polícia Civil, outro caminho não resta que a improcedência dos pedidos inicias, visto a ausência de previsão legal”, decidiu.
O Ministério Público recorreu ao Tribunal de Justiça de Minas Gerais, mas o caso ainda não foi julgado.
Processo 0092152-37.2014.8.13.0035

quinta-feira, 19 de novembro de 2015

Ofício do MPF mostra uso de documentos "trazidos informalmente" da Suíça


PEDALADA PROBATÓRIA

Ofício do MPF mostra uso de documentos "trazidos informalmente" da Suíça


O ofício é de dezembro de 2014, quando os procuradores da República Deltan Dallagnol e Athayde Ribeiro Costa encaminham “mídia contendo extratos e dados de contas bancárias mantidas por Paulo Roberto Costa no exterior, recebidos informalmente”, para a Secretaria de Pesquisa e Análise do MPF. Eles pedem a análise de toda a documentação, a identificação dos créditos e débitos das contas bancárias, “com especificação dos países de origem, dados das contas bancárias, a qualificação dos proprietários beneficiários”.
Apesar de o documento trazido a público na última semana pela ConJurmostrar a entrega de dados referentes a “Paulo Roberto Costa, Alberto Youssef e outros” pelo Ministério Público suíço, o MPF garante que opendrive trazido continha apenas dados relativos a Costa. O órgão afirma que, em seu acordo de delação premiada na operação “lava jato”, o ex-diretor de abastecimento da Petrobras abriu mão de seu sigilo e autorizou o acesso a seus dados bancários.
O MPF alega que contatos diretos entre membros do Ministério Público do Estado requerente e do Estado requerido “são considerados boas práticas na cooperação internacional, sendo tais contatos diretos recomendados enfaticamente por órgãos como o United Nations Office on Drugs and Crime”.
No entanto, como o tratado de cooperação jurídica entre o Brasil e a Suíça para matéria penal deixa claro que cabe à Secretaria Nacional de Justiça do Ministério de Justiça fazer pedidos e autorizar a troca de documentos, advogados veem o ofício entregue pelo MPF como uma “confissão” de que os procuradores agiram contra a lei. Os profissionais apontam que só existe uma forma legal de um procurador da República receber informação protegida por sigilo: formalmente e seguindo os trâmites legais e constitucionais.
O professor de Direito Constitucional da PUC-SP Pedro Estevam Serrano, que advoga para a Odebrecht na “lava jato”, é direto: “O documento confirma que houve ilegalidade ao trazer os dados e, como o Paulo Roberto Costa é figura central no caso, o problema deverá se espalhar por toda a operação”. Serrano faz menção à teoria do fruto da árvore envenenada: se uma árvore está envenenada, nenhum dos seus frutos pode ser aproveitado.
A criminalista Marina Coelho Araújo, sócia do CAZ Advogados, classifica como inquietante “a relutância do Ministério Público Federal em seguir os procedimentos previstos pela legislação durante as investigações da ‘lava jato’”. A advogada aponta que são os procedimentos que constroem a legitimidade do processo e que, na busca de uma suposta eficácia no combate à corrupção, “não pode valer tudo”.
Marina afirma que não se pode justificar o atalho tomado pelo MPF com uma suposta tendência internacional em se buscar novas provas in loco. “Nos países ocidentais em que reina o Estado Democrático de Direito, ou bem o Ministério Público investiga e processa seguindo as regras impostas pela lei, ou a investigação não tem qualquer valor jurisdicional”, sentencia.
Organização e registro
Em resposta a questionamentos feitos pela ConJur, o Ministério Público Federal diz que “não se pode confundir a mera troca de informações (dados de inteligência) com o procedimento de remessa de provas (evidências a serem usadas em juízo)”. Os dados bancários do pendrive suíço, segundo o órgão, se enquadrariam na primeira classificação.

Além disso, o MPF diz que o fato de os dados bancários terem sido obtidos antes de o Ministério da Justiça ter autorizado a troca da informações não invalida as provas idênticas que foram trazidas por via legal. Isso porque o pedido de cooperação foi enviado ao Ministério da Justiça em agosto de 2014 e os procuradores trouxeram o pendrive “informalmente” em novembro de 2014 — ou seja, eles pediram pela via formal antes de irem à Suíça buscar sem terem a autorização.
O órgão justifica que os documentos serviram apenas para “organização de registros e análise interna por parte do próprio MPF, inclusive com o objetivo de verificar a veracidade das declarações prestadas por Paulo Roberto Costa, como colaborador”.
O criminalista Paulo Sérgio Leite Fernandes, no entanto, lembra que o Ministério Público não pode nem sequer trazer provas envolvidas por sigilo bancário para o país sem providências "muito sofisticadas ligadas à legalização da documentação". "Não é só pegar um USB e trazer. Isso dá cadeia, ou deve dar, a não ser que haja benevolência extravagante do Poder Judiciário", critica. Para o advogado, o ofício que foi entregue nesta sexta pelo MPF "é, certamente, assunção da posse do corpo de delito".
Daniel Gerber, do Eduardo Antônio Lucho Ferrão Advogados Associados, por sua vez, aponta que, “quando ambas as autoridades desprezam o mandamento legal de seus respectivos países, é porque não agiram enquanto ‘autoridades’. Não representaram a nação, o povo ou nossas leis”. A prova assim obtida, afirma, submete os responsáveis pela quebra deliberada da lei à responsabilização que lhes forem cabíveis em sede judicial e administrativa.
O advogado Pedro Martini Agatão, do Kuntz Advocacia e Consultoria Jurídica, vai mais longe e prevê que o Supremo Tribunal Federal, quando instado a se pronunciar sobre a questão, “certamente irá repudiar a conduta do MPF, reconhecendo a ilicitude da prova, bem como de todas as provas dela eventualmente derivadas, devendo ser desentranhadas dos autos, conforme prevê expressamente o artigo 157 do Código de Processo Penal”.
O Ministério Público Federal, em nota, afirma que o ataque “absolutamente infundado” ao procedimento adotado pelos órgãos de cooperação “faz parte da estratégia de comunicação adotada por alguns dos réus e empresas sob investigação, com o intuito de criar, artificialmente, atmosfera favorável ao reconhecimento de irregularidades imaginárias e teses estapafúrdias”.
Clique aqui para ler o ofício entregue do MPF.
Clique aqui para ler a resposta do MPF à ConJur.

 é chefe de redação da revista Consultor Jurídico.
Revista Consultor Jurídico, 13 de novembro de 2015, 21h30

Recurso em HCs é ato privativo de advogado e exige procuração nos autos


SÚMULA 115

Recurso em HCs é ato privativo de advogado e exige procuração nos autos

Embora seja possível que qualquer indivíduo impetre Habeas Corpus em seu próprio favor ou no de outra pessoa, a regra não se estende à interposição do respectivo recurso ordinário. O entendimento é da 5ª Turma do Superior Tribunal de Justiça, que seguiu o voto do relator, ministro Reynaldo Soares da Fonseca, no julgamento de um recurso em habeas corpus.
No recurso julgado, era pedido o reconhecimento de nulidade de um decreto de prisão por crime sexual. O recurso foi interposto por advogado, porém, sem mandato. Ele classificou de “contrassenso” a exigência de procuração para impetração de recurso, uma vez que o documento é dispensado para Habeas Corpus.
Para a turma, o recurso em Habeas Corpus deve ser interposto por advogado com procuração nos autos. Caso contrário, deve ser aplicada por analogia a Súmula 115 do STJ, que diz que na instância especial é inexistente recurso interposto por advogado sem procuração nos autos. Assim o ministro Reynaldo reforçou que a procuração é um requisito formal, que deve acompanhar a petição do recurso. Seguindo o voto do relator, a turma considerou o recurso inadmissível. Com informações da Assessoria de Imprensa do STJ.
Revista Consultor Jurídico, 16 de novembro de 2015, 21h00