"Eu não recearia muito as más leis, se elas fossem aplicadas por bons juízes. Não há texto de lei que não deixe campo à interpretação.

A lei é morta. O magistrado vivo. É uma grande vantagem que ele tem sobre ela" - Anatole France

terça-feira, 1 de dezembro de 2015

Novo Código de Processo Civil quebra paradigma das "condições da ação"


Novo Código de Processo Civil quebra paradigma das "condições da ação"

O presente artigo busca, de maneira sintética, esclarecer as principais alterações acarretadas pelo novo Código de Processo Civil no que tange às condições da ação.
Para tanto, estabeleceremos o conceito, natureza jurídica e espécies de condições da ação, quais sejam: a legitimidade de parte, interesse de agir e possibilidade jurídica do pedido.
Devidamente conceituadas as condições da ação, passaremos a analisar como se inseriam na sistemática do Código de Processo Civil de 1973. Explicaremos a Teoria Eclética da Ação, bem como as duas principais correntes que se formaram ante a problemática surgida em relação a seus efeitos práticos — a Teoria da Apresentação e a da Asserção.
Por fim, discorreremos acerca do tratamento dado à matéria pelo novo Código de Processo Civil e do encerramento da celeuma doutrinária encabeçada pelas duas teorias supracitadas.
Condições da ação: conceito, natureza jurídica e espécies
Condições da ação são requisitos processuais essenciais para o regular trâmite processual e eventual julgamento do mérito. Em caso de ausência de qualquer uma das condições da ação, teremos a carência da ação, causa de extinção do processo sem julgamento de mérito (art. 267, VI, CPC/73). Note-se, contudo, que tal regra foi e vem sendo mitigada pela teoria da asserção, a qual analisaremos mais à frente.

A Teoria Geral do Processo costuma compreender as condições da ação como uma categoria fundamental do processo moderno, localizada entre os pressupostos processuais e o mérito da causa.
Entendemos, no que tange o processo civil, condições da ação como um feixe composto por três institutos, quais sejam: legitimidade ad causam, interesse de agir e possibilidade jurídica do pedido.
Legitimidade ad causam nada mais é do a pertinência subjetiva da ação, ou seja, qualidade expressa em lei que autoriza o sujeito (autor) a invocar a tutela jurisdicional. Nessa lógica, será réu aquele contra qual o autor pretender algo.
Para a compreensão do interesse de agir (artigo 3° CPC/73), devemos cingir o conceito em três acepções:
a) Necessidade: traduz-se na idéia de que somente o processo é o meio hábil à obtenção do bem da vida almejado pela parte;
b) Utilidade: significa que o processo deve propiciar, ao menos em tese, algum proveito ao demandante;
c) Adequação: por ele, entende-se que a parte deve escolher a via processual adequada aos fins que almeja.
Significativa parte da doutrina critica esta última acepção do interesse de agir, vez que, nas palavras de Fredie Didier Jr.[1]:
“O procedimento é a espinha dorsal da relação jurídica processual. O processo, em seu aspecto formal, é procedimento. O exame da adequação do procedimento é um exame de sua validade. Nada diz respeito ao exercício do direito de ação.
“Não há erro na escolha do procedimento que não possa ser corrigido, por mais discrepantes que sejam o procedimento indevidamente escolhido e aquele que se reputa correto. Um exemplo talvez sirva para expor o problema: se o caso não é de mandado de segurança, pode o magistrado determinar a emenda da petição inicial, para que o autor providencie a adequação do instrumento da demanda ao procedimento correto. Não existisse o inciso V do art. 295, que expressamente determina uma postura do magistrado no sentido aqui apontado, sobraria a regra da instrumentalidade das formas, prevista nos arts. 244 e 250 do CPC, que impõe o aproveitamento dos atos processuais, quando houver erro de forma.”
Nessa toada, podemos conceituar interesse de agir como o binômio necessidade/utilidade.
A possibilidade jurídica do pedido, por fim, terceiro e último instituto da classificação clássica das condições da ação, consubstancia a aptidão — implícita ou explícita — no ordenamento jurídico, de que a demanda do autor possui para ser julgada procedente.
Ilustremos com exemplo doutrinário pedestre, mas didático: carece de possibilidade jurídica do pedido aquele que busca ajuizar ação de divórcio em país que expressamente o veda em seu ordenamento legal.
Teoria Eclética da Ação e suas controvérsias
Inicialmente, devemos deixar claro que as condições da ação, embora expressamente previstas no Código de Processo Civil de 1973, nunca foram matéria doutrinariamente pacífica ou unânime.

As condições da ação são fruto de uma teoria encabeçada por Liebman que informa todo o CPC de 1973: a Teoria Eclética da Ação.
Considera citada teoria que, para o exercício regular do direito de ação, imprescindível o preenchimento de certos requisitos (legitimidade ad causam, interesse de agir e possibilidade jurídica do pedido), que formariam a categoria denominada “condições da ação”. Não preenchidas estas condições, estaríamos diante da carência da ação.
Ocorre que, na realidade processual, o magistrado não realiza um juízo específico de análise das condições da ação, e sim um juízo de admissibilidade e um juízo de mérito.
Nessa toada, verifica-se que as condições da ação não são analisadas autonomamente, recaindo, portanto em um desses dois juízos. Dessa forma, tem-se que as condições da ação ou seriam questões de admissibilidade ou questões de mérito.
Diante desse problema, duas correntes se formaram.
A primeira é a Teoria da Apresentação, capitaneada por Cândido Rangel Dinamarco. Sustenta, na linha do disposto no §3°, artigo 267, CPC, que “o juiz conhecerá a qualquer tempo ou grau de jurisdição, enquanto não proferida sentença de mérito, as matérias constantes nos incisos VI (...)”. O inciso VI, por sua vez, trata justamente da extinção do processo sem resolução de mérito por ausência de “possibilidade jurídica, a legitimidade das partes e o interesse processual”.
A segunda corrente consubstancia-se na adoção da chamada Teoria da Asserção.
Tal teoria cinge o momento e os efeitos do reconhecimento de ausência de qualquer das condições da ação.
Primeiramente, o magistrado verificará, abstratamente, a presença das condições da ação na fase postulatória. Caso averigue a ausência de qualquer uma delas, extinguirá o feito sem resolução de mérito, nos termos do artigo 267, VI, CPC.
Se, contudo, a ausência de uma das condições da ação for averiguada após o início da fase instrutória, extinguirá o feito com resolução do mérito, julgando improcedente o pedido.
Os efeitos de tais decisões, como podemos imaginar, são absolutamente distintos. No primeiro caso teremos carência da ação, permitindo-se sua repropositura, não sendo apta, tal decisão, a gerar coisa julgada. O exato oposto ocorre no segundo caso. Estaremos diante sentença que resolve o mérito, apta, portanto, à coisa julgada. Do mesmo modo, incabível a repropositura da ação, devendo o autor irresignado perseguir a procedência de sua demanda pelas vias recursais.
De fato, parece-nos correta a aplicação da Teoria da Asserção, inclusive por privilegiar os princípios da efetividade e da celeridade.
Verifica-se, contudo, que com o surgimento do novo Código de Processo Civil, tal teoria perdeu a razão de ser.
O Código de Processo Civil de 2015 e as condições da ação
O Código de Processo Civil de 2015 extinguiu, como categoria, as condições da ação. Note-se: o instituto foi extinto, mas seus elementos permaneceram intactos, tendo sofrido, contudo, um deslocamento.

Tomando-se o fato de que o magistrado realiza dois juízos (de admissibilidade e mérito), o novo CPC buscou separar os elementos integrantes das condições da ação alocando-os em pressupostos processuais (relativos ao juízo de admissibilidade da ação) e como questão de mérito.
Nos informa o artigo 17 do CPC 2015: “Para postular em juízo é necessário ter interesse e legitimidade”. Temos, portanto, que o interesse de agir e a legitimidade ad causam passaram a ser tratados como pressupostos processuais.
Dessa forma, verificando o juiz, ao receber a inicial, que se encontram ausentes interesse de agir ou legimidade ad causam, indeferirá a petição inicial. Nesse sentido:
Art. 330.  A petição inicial será indeferida quando:
(..)
II - a parte for manifestamente ilegítima;
III - o autor carecer de interesse processual;
Caso for verifique-se a ausência de um desses pressupostos após a fase postulatória, será declarada a carência da ação. Afirma o art. 485. CPC 2015:
Art. 485.  O juiz não resolverá o mérito quando:
(...)
VI - verificar ausência de legitimidade ou de interesse processual;
A possibilidade jurídica do pedido, por sua vez, passou a ser considerada questão de mérito. Nada mais coerente. De fato, quando a parte apresenta demanda de manifesta impossibilidade jurídica, por certo não se trataria de carência da ação, mas sim de uma verdadeira improcedência do pedido, resolvendo-se, assim, o mérito.
Art. 487.  Haverá resolução de mérito quando o juiz:
I - acolher ou rejeitar o pedido formulado na ação ou na reconvenção;
Concluímos, assim, louvando o tratamento dado pelo novo Código de Processo Civil à legitimidade de parte, interesse de agir e possibilidade jurídica do pedido. Pôs-se um fim a um debate doutrinário de mais de quarenta anos e quebrou-se o paradigma das “condições da ação” que, muitas vezes, era alçada a um status ontológico. 

Referências
- DIDIER JR, Fredie. Curso de Direito Processual Civil. vol. I, ed. 11. Ed. Juspodivm.

- GRINOVER, Ada Pellegrini; CINTRA, Antônio Carlos de Araújo; DINAMARCO, Cândido Rangel. Teoria Geral do Processo. 29. ed. São Paulo: Malheiros Ed.

[1] DIDIER JR, Fredie. Curso de Direito Processual Civil. vol. I, ed. 11. Ed. Juspodivm. Salvador: 2009, p. 199.
 é advogado em São Paulo.
Revista Consultor Jurídico, 30 de novembro de 2015, 9h45

O Recurso Extraordinário n.º 603.680 e as pensões por morte do Servidor Público


O Recurso Extraordinário n.º 603.680 e as pensões por morte do Servidor Público

O presente artigo discorre sobre o Recurso Extraordinário nº 603.680 e as pensões por morte do Servidor Público

Fonte: Bruno Sá Freire Martins

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O Supremo Tribunal Federal recentemente decidiu controvérsia acerca dos proventos de pensão por morte daqueles beneficiários cujo servidor havia se aposentado antes do advento da Emenda Constitucional n.º 41/03 e o seu óbito ocorreu após a regulamentação da mesma por intermédio da Medida Provisória n.º 167/04 de 19 de Fevereiro, posteriormente convertida na Lei n.º 10.887/04.
Tudo porque até a edição desse novo ordenamento jurídico previdenciário os proventos alusivos às pensões por morte correspondiam à última remuneração ou proventos recebidos pelo falecido e eram reajustados sempre que fossem concedidos aumentos de qualquer natureza aos servidores em atividade.
Assim, estava assegurado, também, aos pensionistas a integralidade e a paridade dos proventos.
A mudança constitucional, regulamentada na sequência, afastou da condição de regra geral para os ganhos decorrentes da pensão essas duas regras.
Tendo estabelecido que os proventos são integrais quando o valor recebido pelo de cujus em vida seja igual ou inferior ao limite máximo do salário de benefício do INSS e nos casos em que o mesmo seja superior a esse limite será pago somente 70% (setenta por cento) desse excedente.
Enquanto que os reajustes deixaram de observar a regra da paridade e passaram a reger-se pelo princípio da preservação do valor real do benefício, ou seja, somente serão concedidos aumentos que permitam a reposição das perdas inflacionárias sofridas no ano anterior.
Inicialmente, não haveria de pairar dúvidas quanto a metodologia de cálculo e reajuste dos proventos da pensão por morte ante ao teor da Súmula 340 do Superior Tribunal de Justiça:
A lei aplicável à concessão de pensão previdenciária por morte é aquela vigente na data do óbito do segurado.
Evidenciando-se, assim, o entendimento de que para todos os óbitos ocorridos após a regulamentação do novo texto constitucional o benefício deveria observar a regra estabelecida a partir de então.
Entretanto, alguns Tribunais do País, sob o fundamento de que estavam diante de situações que caracterizariam o direito adquirido previsto no artigo 3º da Emenda Constitucional n.º 41/03, entenderam que, nos casos em que o falecido havia se aposentado antes de 31/12/2003 e o seu óbito ocorrera após a regulamentação da referida Emenda, estaria assegurado, também aos pensionistas, o direito a integralidade dos proventos, independentemente de seu valor, e a paridade com a remuneração dos servidores em atividade.
Por se tratar de matéria constitucional o tema foi levado ao Supremo Tribunal Federal que, no Recurso Extraordinário n.º 603.680, afirmou:
Ementa: RECURSO EXTRAORDINÁRIO. CONSTITUCIONAL. PREVIDENCIÁRIO. PENSÃO POR MORTE. INSTITUIDOR APOSENTADO ANTES DA EMENDA CONSTITUCIONAL 41/2003, PORÉM FALECIDO APÓS SEU ADVENTO. DIREITO DO PENSIONISTA À PARIDADE. IMPOSSIBILIDADE. EXCEÇÃO: ART. 3º DA EC 47/2005. RECURSO EXTRAORDINÁRIO A QUE SE DÁ PARCIAL PROVIMENTO. I – O benefício previdenciário da pensão por morte deve ser regido pela lei vigente à época do óbito de seu instituidor. II – Às pensões derivadas de óbito de servidores aposentados nos termos do art. 3º da EC 47/2005 é garantido o direito à paridade. III – Recurso extraordinário a que se dá parcial provimento. (RE 603580, Relator(a):  Min. RICARDO LEWANDOWSKI, Tribunal Pleno, julgado em 20/05/2015, ACÓRDÃO ELETRÔNICO REPERCUSSÃO GERAL - MÉRITO DJe-152 DIVULG 03-08-2015 PUBLIC 04-08-2015)
É bem verdade que da análise da Ementa aqui lançada, não é possível confirmar que a situação restou solucionada.
Isso porque a referência feita à Emenda Constitucional n.º 47/05 não deixa claro a sua utilização como fundamento para a solução da controvérsia, já que o artigo mencionado estabelece que:
Art. 3º Ressalvado o direito de opção à aposentadoria pelas normas estabelecidas pelo art. 40 da Constituição Federal ou pelas regras estabelecidas pelos arts. 2º e 6º da Emenda Constitucional nº 41, de 2003, o servidor da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios, incluídas suas autarquias e fundações, que tenha ingressado no serviço público até 16 de dezembro de 1998 poderá aposentar-se com proventos integrais, desde que preencha, cumulativamente, as seguintes condições:
I - trinta e cinco anos de contribuição, se homem, e trinta anos de contribuição, se mulher;
II - vinte e cinco anos de efetivo exercício no serviço público, quinze anos de carreira e cinco anos no cargo em que se der a aposentadoria;
III - idade mínima resultante da redução, relativamente aos limites do art. 40, § 1º, inciso III, alínea "a", da Constituição Federal, de um ano de idade para cada ano de contribuição que exceder a condição prevista no inciso I do caput deste artigo.
Parágrafo único. Aplica-se ao valor dos proventos de aposentadorias concedidas com base neste artigo o disposto no art. 7º da Emenda Constitucional nº 41, de 2003, observando-se igual critério de revisão às pensões derivadas dos proventos de servidores falecidos que tenham se aposentado em conformidade com este artigo.
Tendo a redação reformadora se limitado apenas a garantir o direito à paridade dos pensionistas cujo benefício decorra de óbito de servidor aposentado com fundamento na regra transitória.
Em verdade a solução para o deslinde da causa reside na tese fixada no Recurso Extraordinário, cuja aplicação deve se dar erga omnes por ter sido reconhecida a repercussão geral da matéria tratada no recruso, com o seguinte teor:
Os pensionistas de servidor falecido posteriormente à EC nº 41/2003 têm direito à paridade com servidores em atividade (EC nº 41/2003, art. 7º), caso se enquadrem na regra de transição prevista no art. 3º da EC nº 47/2005. Não tem, contudo, direito à integralidade (CF, art. 40, § 7º, inciso I).
Aqui sim fica evidente o intento do Supremo Tribunal Federal em estabelecer que somente terão direito à paridade os proventos de pensão cujo servidor falecido preencha os requisitos exigidos pela dita Emenda para aposentadoria pela regra 85/95.
Então, para aplicação da tese fixada pela Corte Maior é preciso que seja feita uma espécie de simulação da situação do servidor falecido, com o objetivo de verificar se o mesmo preencheria os requisitos para a inativação pelas regras contidas no artigo 3º.
Obviamente que o marco final da idade, dos tempos de contribuição, serviço público, carreira e de cargo efetivo, em que se daria a aposentadoria, serão aqueles que o servidor contava no momento em que de fato foi aposentado.
Só para exemplificar, imaginemos um servidor, cujo ingresso no serviço público se deu em 1971 e se aposentou em 30/12/2001 contando nessa data com 38 anos de contribuição, 30 de serviço público, tempo que também possuía na carreira e no cargo e idade de 57 anos de idade.
Nesse caso é possível afirmar que o mesmo, também poderia se aposentar pela regra 85/95, caso a mesma já estivesse vigente, por ter preenchido todos os requisitos por ela exigidos na data de sua real inativação.
E tendo vindo a óbito em 2010, será possível invocar o entendimento do Supremo Tribunal Federal, assegurando a seus pensionistas o direito à paridade com a remuneração dos servidores em atividade.
Na situação ora colocada surgem alguns questionamentos:
1) Por que o termo final da contagem do lapso temporal é a data da aposentadoria?
2) Como aplicar uma regra que ainda não existia, a uma situação já acobertada pelo manto do ato jurídico perfeito?
3) E como fica o teor da Súmula n.º 340 do Superior Tribunal de Justiça?
De todos os questionamentos apresentados, o que possui resposta mais simples é o primeiro, uma vez que, não é possível reconhecer como tempo de serviço público, de carreira e de efetivo exercício no cargo o período em que o servidor esteve aposentado.
Além disso, a própria Emenda Constitucional n.º 41/03, com a decisão proferida na Ação Direta de Inconstitucionalidade n.º 3.105, limitou as contribuições previdenciárias dos aposentados somente às hipóteses em que os proventos recebidos pelo ex-servidor sejam superiores ao limite máximo do salário de contribuição do INSS, então esse período só pode ser computado como tempo de contribuição quando o aposentado receber proventos superiores a esse valor.
Enquanto que a decisão da Corte Maior alcança a todos pensionistas sem distinção quanto ao fato de terem contribuído ou não durante o período em que estiveram inativos.
Não se admitindo, portanto, outra conclusão, senão a de que o tempo de contribuição somente pode ser considerado até o momento da publicação do ato de aposentadoria, por ser esse o único período em que a contribuição previdenciária alcança a todos os servidores ativos.
O segundo questionamento, talvez se constitua no mais difícil de ser resolvido, uma vez que ao se analisar o acórdão somente se constata que o Eminente Ministro Luís Roberto Barroso afirmou, em seu voto, que:
... É relevante notar que o servidor instituidor da pensão, no presente caso, ingressou no serviço público (e se aposentou) anteriormente à EC 20/1998. O servidor atendeu, ainda, aos requisitos do art. 3º da EC 47/2005 (fl. 101), nos termos do disposto no art. 4º da EC 20/1998, segundo o qual: o tempo de serviço considerado pela legislação vigente para efeito de aposentadoria, cumprido até que a lei discipline a matéria, será contado como tempo de contribuição.
Assim, os recorridos têm efetivamente direito à paridade de critérios de reajuste com os servidores em atividade que ocupam o mesmo cargo em que se aposentou o servidor falecido, porque o caso se enquadra na nova regra de transição estipulada pelo art. 3º, par. único, EC nº 47/2005, à qual foram conferidos efeitos retroativos à data de vigência da EC nº 41/2003...
Então a única forma de se buscar o real intento do acórdão, salvo melhor juízo, reside na aplicação da regra do melhor benefício em sede de Regime Próprio, implementada pelo próprio Supremo Tribunal Federal no julgamento do Recurso Extraordinário n.º 630.501/RS, in verbis:
APOSENTADORIA – PROVENTOS – CÁLCULO. Cumpre observar o quadro mais favorável ao beneficiário, pouco importando o decesso remuneratório ocorrido em data posterior ao implemento das condições legais. Considerações sobre o instituto do direito adquirido, na voz abalizada da relatora – ministra Ellen Gracie –, subscritas pela maioria. (RE 630501, Relator(a):  Min. ELLEN GRACIE, Relator(a) p/ Acórdão:  Min. MARCO AURÉLIO, Tribunal Pleno, julgado em 21/02/2013, DJe-166 DIVULG 23-08-2013 PUBLIC 26-08-2013 REPERCUSSÃO GERAL - MÉRITO EMENT VOL-02700-01 PP-00057)
Em que pese a decisão versar apenas sobre a aplicação do direito adquirido no momento mais favorável para o segurado, situação não caracterizada aqui, já que não há direito adquirido e sim mera expectativa.
Isso porque, o direito ao recebimento da pensão por morte somente se constitui a partir do falecimento do servidor.
Tal entendimento admite sua aplicação conjunta com os princípios da máxima efetividade e da força normativa da Constituição.
Segundo o princípio da máxima efetividade ou da eficiência a uma norma constitucional deve ser atribuído o sentido que maior eficácia lhe conceda e o da força normativa da constituição que apregoa que entre as interpretações possíveis, deve ser adotada aquela que garanta maior eficácia, aplicabilidade e permanência das normas constitucionais. [1]
Já a força normativa da Constituição determina que na solução dos problemas jurídico-constitucionais, deve-se dar prevalência aos argumentos que, levando em conta os pressupostos normativos da Constituição, contribuam ou conduzam a uma eficácia máxima. Necessariamente, isso implica uma primazia de soluções interpretativas que levem em conta a historicidade da estrutura constitucional e possibilitem sua “atualização” normativa, ao mesmo tempo que garanta eficácia e permanência às suas normas. [2]
Ou seja, o fato de o servidor poder se aposentar pela regra 85/95 que outorgava direito também a seus pensionistas aliado à necessidade de que sejam atribuídas às normas constitucionais, dentre as quais se encontram aquelas integrantes do texto de Emendas, sua maior eficácia, autorizaria a interpretação levada a efeito pela Corte Maior.
E afasta qualquer questionamento quanto a ausência de vigência da Emenda Constitucional n.º 47/05 no momento da aferição da presença dos requisitos para a aposentadoria.
Por fim, no que tange a ofensa ao disposto na Súmula 340 do Superior Tribunal de Justiça, ainda que por linhas transversas o STF afirmou que o direito a isonomia, nesse caso, não seria proveniente do benefício da pensão, mas sim da possibilidade de aplicação da regra de aposentadoria e de suas consequências previstas na própria Emenda Constitucional n.º 47/05, não se aplicando, portanto, nesse caso seus ditames.
E ainda que assim não fosse, a Emenda Constitucional n.º 47/05 teve seus efeitos retroagidos até a data de publicação da EC n.º 41/03, dessa forma, fato que reforça o direito à isonomia dos pensionistas e faz já que a vigência retroativa permitiu que a mesma produzisse efeitos no período anterior à sua publicação, afastando, com isso, qualquer ofensa à referida Súmula.
Assim, com a decisão proferida pela Corte restou estabelecido que é possível a extensão da isonomia aos proventos dos pensionistas cujo óbito do servidor tenha se dado posteriormente à regulamentação da Emenda Constitucional n.º 41/03, quando a aposentadoria do mesmo, tenha se dado em data anterior a reforma e ele tenha preenchido os requisitos para a concessão da inativação também pela regra 85/95 que nesse caso será utilizada apenas como parâmetro de verificação.
Notas:
1- MORAES, Alexandre de. DIREITO CONSTITUCIONAL. 27ª edição, editora Atlas, página 16.
2 - FERNANDES, Bernardo Gonçalves. CURSO DE DIREITO CONSTITUCIONAL, 2ª edição, editora Lumen Juris, página 158.

Leonardo Sarmento
Servidor público efetivo do Estado de Mato Grosso
advogado; pós-graduado em Direito Público e em Direito Previdenciário; professor da LacConcursos e de pós-graduação na Universidade Federal de Mato Grosso, no ICAP – Instituto de Capacitação e Pós-graduação (Mato Grosso), no Instituto Infoc - Instituto Nacional de Formação Continuada (São Paulo), no Complexo Educacional Damásio de Jesus - curso de Regime Próprio de Previdência Social (São Paulo); fundador do site Previdência do Servidor (www.previdenciadoservidor.com.br); Presidente da Comissão de Regime Próprio de Previdência Social do Instituto dos Advogados Previdenciários – Conselho Federal (IAPE); membro do Cômite Técnico da Revista SÍNTESE Administração de Pessoal e Previdência do Agente Público, publicação do Grupo IOB; escreve todas as terças-feiras para a Coluna Previdência do Servidor no Jornal Jurid Digital (ISSN 1980-4288) endereço www.jornaljurid.com.br/colunas/previdencia-do-servidor, autor dos livros DIREITO CONSTITUCIONAL PREVIDENCIÁRIO DO SERVIDOR PÚBLICO, A PENSÃO POR MORTE e REGIME PRÓPRIO – IMPACTOS DA MP n.º 664/14 ASPECTOS TEÓRICOS E PRÁTICOS, todos da editora LTr e do livro MANUAL PRÁTICO DAS APOSENTADORIAS DO SERVIDOR PÚBLICO da editora Rede Previdência/Clube dos Autores e de diversos artigos nas áreas de Direito Previdenciário e Direito Administrativo.


Acessado e disponível na Internet em 01/12/2015 no endereço -